domingo, 26 de julho de 2009

Capitulo XIV

Sem perder tempo, todos seguiram caminho pelo lago congelado. A neve que caía escondia a grossa camada de gelo de pouco mais de 15 centímetros que se estendia sob seus pés e seguia em direção até onde a vista alcançava. E no momento, ninguém conseguia enxergar mais do que 100 metros à frente, por culpa daquela nevasca que desenhava todo o clima daquela região de Tundra Infame. Temendo que alguém acabasse se perdendo naquela imensidão branca e gelada, Mehldrik orientou a todos que permanecessem juntos, andando em grupo. A nevasca tornou-se mais constante e forte, com rajadas de ventos que dificultavam a movimentação pela neve espessa. Todos procuraram se proteger daquele clima extremamente frio agasalhando-se da melhor maneira que podiam, usando suas mantas com capuz e luvas grossas feitas com pele de lincorne pelos melhores artesãos das regiões de Tundra Infame. Ocasionalmente, durante aquela jornada perigosa pelo lago congelado, podiam ouvir ao longe uivos tenebrosos de lobos zumbis, andando em matilhas desesperadas à procura de comida.
Estavam andando há algumas horas, quando Vohldrik avistou ali próximo algo se mexendo por debaixo da neve, em um pequeno monte formado ali.
- Pessoal, tem alguma coisa se mexendo ali. – disse o jovem guerreiro, apontando à sua esquerda.
- Espere, Vohldrik, fique aí. – alertou Mehldrik – Não sabemos o que pode ser. Fiquem aqui. – O Guardião Arcano caminhou em direção ao local vagarosamente, apenas empunhando sua katana.
Havia algo ali realmente, e se mexia sem parar. Era um solitário e inquieto lebrecorne, que remexia sem parar a neve, lançando-a com suas minúsculas patas para todos os lados. O pequenino animal, cujo pêlo branco era uma ótima camuflagem contra os predadores, repentinamente parou, como que sentindo cheiro de perigo próximo dele, levantando suas enormes e pontudas orelhas, tentando captar algum tipo de som que denunciasse a presença de um possível inimigo. Coçou o nariz, e congelou o olhar na direção de Mehldrik e dos outros que estavam ali perto. O lebrecorne permaneceu parado, a princípio paralisado de medo, mas não demorou muito para ele sair pulando em disparada e desaparecer na imensidão de neve.
- Era apenas um lebrecorne – disse Mehldrik, sem se virar. Ainda estava olhando atentamente aquele monte ali perto dele. Havia algo mais ali, e talvez o pequeno animal estivesse remexendo aquele monte à procura de comida ou algo que tenha atraído sua atenção. Aproximou-se com certa cautela, para enxergar melhor o que seria aquilo caído e quase coberto pela neve.
- Vamos embora então. É melhor não perder mais tempo. – disse Drakonyh contrariado. – Não suporto mais ver tanta neve. Até meus pensamentos congelaram.
- Não sou muito de concordar com qualquer um, mas Drakonyh tem razão. – opinou Hevelin – Não podemos perder mais tempo.
- Agradeço que tenha concordado comigo, minha amiga – o espadachim soltou um leve sorriso – Apesar de não me dar bem com a maioria dos duelistas que conheço, você tem uma personalidade com a qual simpatizei.
- Não se preocupe – respondeu a duelista, de cara fechada – Concordei contigo apenas porque você disse uma verdade, e não para agradar você. Também não sou de muita amizade com espadachins arcanos.
Drakonyh sentiu-se desarmado com a resposta, mas continuou sorrindo, meio sem graça. Estava quase chegando à conclusão de que não tinha mesmo sorte com qualquer tipo de amizade com duelistas.
- É... pelo menos valeu a tentativa. – disse o espadachim, dando de ombros, ainda sorrindo sem graça.
- Pessoal, esperem um pouco. – interrompeu Mehldrik, com uma voz um pouco tensa. – Acho que encontrei algo aqui.
- O que você encontrou? – perguntou Lehvinia, com ar de extrema curiosidade.
- Não sei ainda, mas acredito que não seja algo bom.
Mehldrik aproximou-se mais, e ajoelhou-se sobre aquele pequeno monte. O lebrecorne havia espalhado um pouco da neve ao redor. O guardião arcano decidiu tirar mais um pouco da neve, afastando com as mãos, e à medida que foi limpando o local, revelou-se diante dele o corpo inerte e congelado de uma pessoa.
- É um corpo. – disse Mehldrik, sem rodeios.
- O que? – assustou-se Lehvinia – Um corpo? Como assim um corpo?
- Está morto? – questionou Amarantys rapidamente.
- Sim. – respondeu Mehldrik, depois de analisar a pulsação. – Pelas vestimentas, acredito que era um comerciante errante.
- Será que foi atacado por algum animal? Gorilas, pantrocornes? – indagou Vohldrik.
- Não, pois não tem marcas de feridas. Suas roupas não estão rasgadas, e nem existe rastro de sangue ao redor dele. – Mehldrik foi escavando ao redor daquele corpo, enquanto investigava mais sobre a possível causa da sua morte. – Provavelmente deve ter morrido por causa do frio excessivo. Mas tem algo de estranho aqui.
- O que mais de estranho pode haver em se morar num lugar onde você pode morrer de frio? – retrucou Drakonyh. – Não entendo como as pessoas podem morar num lugar como esse.
- Não sei explicar direito. – disse Mehldrik, enquanto olhava intrigado para o rosto daquele comerciante morto. A expressão congelada deixada por aquele pobre coitado antes de morrer era de puro pavor, como se tivesse visto algo horrendo, maligno. – O olhar dele congelado, é como se ele tivesse visto a morte em pessoa.
Mehldrik revirou os bolsos do casaco e o bornal de couro que estava preso pela alça ao corpo do comerciante. Entre cadernetas de anotações, mapas da região, um pequeno aparelho antigo de GPS e amostras de peles de diversos animais catalogados em pequenos frascos, o jovem guardião encontrou um saquinho de veludo cor de vinho. Dentro dele havia duas pequenas pedras de quartzo de cor dourada opaca, lapidadas com faces hexagonais. Eram duas pedras guia. Elas eram feitas com o quartzo dourado, um tipo de mineral encontrado nas profundezas de algumas das minas daquela região e que tinha um tipo de poder bastante incomum e que foi descoberto pelos alquimistas que tentaram utilizá-la pela primeira vez para outras finalidades. Aquele quartzo tinha o poder de teleportar as pessoas para locais e lugares onde houvesse maior concentração do mesmo mineral. Por causa disso, muitos dos maiores condados de Nevareth ergueram, em suas praças principais, diversas estátuas e monumentos feitos de quartzo dourado, com o propósito de concentrar o poder de teleporte liberado pelas pedras guia para quem as utilizasse. Inicialmente, esse tipo de teleporte passou a ser utilizado por comerciantes, viajantes errantes, mensageiros e diversos membros dos Conselhos de Oficiais dos condados mais importantes. O seu uso era simples, bastava segurar a pequena na mão fechada, imaginar o local para onde quisesse ir e dizer apenas “Retornar”. Cada pedra podia ser utilizada apenas uma vez, e após seu uso, desaparecia por completo.
- Encontrei um pequeno aparelho de GPS, mas parece quebrado. – Mehldrik tentou fazê-lo funcionar, mas sem sucesso. O portátil aparelho tinha rachaduras no monitor e estava inutilizado completamente. – Ele poderia nos ser muito útil se funcionasse. Em compensação, encontrei duas pedras guias.
Após dizer isso, um estranho assobio soturno pairou no ar, deixando todos em estado de alerta. O assobio cresceu assustadoramente e se transformou em gritos agudos de pavor. Mehldrik, ainda ajoelhado ao lado do corpo inerte, olhou para o lado e viu um vulto negro descendo rapidamente dos céus numa espiral de fumaça negra vindo em sua direção.
- Protejam-se! – gritou para os outros, antes de cair de costas contra a neve. Rapidamente pegou seu escudo astral, ativando-o a tempo de rebater aquela espiral de fumaça que vinha ao seu encontro, lançando-a de volta para o ar.
Imediatamente, todos se jogaram no chão, tentando proteger-se daquelas ameaças que agora voavam sobre suas cabeças perigosamente. Eram diversas sombras mortais, espectros de espíritos malignos que tinham como único objetivo sugar as almas de pessoas vivas.
- Mas o que diabos é isso agora? – gritou Drakonyh, que após se jogar assustado ao chão, ajoelhou-se para tentar enxergar o que era aquilo que os estavam atacando. Balançava as mãos de maneira nervosa, como se estivesse tentando afastar moscas perturbadas de sua cabeça. – Já não bastavam zumbis horríveis e gorilas branquelos, e agora me aparecem fumaças assassinas?
- O que são essas coisas voando sobre a gente? – perguntou Amarantys, um pouco assustada.
- São sombras mortais. – respondeu Vohldrik. – Espíritos errantes. Eu nunca tinha visto um, mas sempre ouvia meu pai contando histórias horríveis sobre esses sugadores de almas.
- Temos que afastá-los daqui. – disse Hevelin. – Eu tenho quase certeza de que aquele pobre coitado ali foi morto por essas coisas.
- Permaneçam abaixados. – continuou alertando Mehldrik. – Vamos armar um ataque para afastá-los daqui.
Lehvinia estava jogada ao chão em meio aos outros, mas contrariando o pedido de Mehldrik, repentinamente ela sentiu sua Força Arcana pulsar firme dentro de si, o que a fez levantar-se ágil. Todos olharam espantados para a jovem maga, que tirou as luvas de suas mãos, colocou as orbes e com apenas um gesto determinante com a mão direita, liberou o poder de sua força espiritual em uma aura iluminada e vibrante em ventos que a rodeavam por completo e que podiam ser vista por todos.
- É isso mesmo o que estou vendo? – indagou Amarantys, meio confusa. – Ela liberou a própria aura?
- Pode ter certeza que sim. – respondeu Drakonyh, com um sorriso de canto de lábio. – Agora vai ficar realmente excitante isso aqui. – Amarantys encarou o espadachim com ar de espanto, mas sua atenção logo se voltou para Lehvinia, envolvida naquela aura luminosa e envolvida pela força espiritual do elemento Vento. As maléficas Sombras Mortais começaram a rodopiar rapidamente no ar ao seu redor, girando em perigosas espirais de fumaça negra. Momentaneamente, elevaram-se um pouco mais nas alturas, para logo em seguida descer com toda força e fúria sobre a Maga possuída em Aura liberta. Lehvinia então começou a concentrar a sua energia astral em diversos elementos, entre, água, fogo, terra e ar, que surgiam ao seu redor, concentrando-se em suas mãos equipadas com as orbes. Ela, então, iniciou o ataque contra aquelas sombras, lançando em sua direção sequências controladas de canhões de gelo, fogo e terra, ora com uma mão, ora utilizando as duas para potencializar mais o poder de ataque. Com sua Aura liberta, Lehvinia podia sentir sua força arcana fluir com mais vigor e intensidade, liberando momentaneamente seu poder de forma incomum. Os canhões foram acertando em cheio aqueles malignos seres, ricocheteando alguns para bem longe e praticamente pulverizando outros mais fracos em pleno ar, até não sobrar qualquer vestígio. Duas daquelas sombras mortais recuaram e partiram pra cima de Mehldrik, que preparava-se para soltar, com seu escudo astral, canhões na direção dos mesmos. Porém, Lehvinia foi muito mais rápida e soltou dois canhões de gelo e fogo, fazendo as perigosas criaturas sumirem no ar acima do Guardião Arcano caído na neve. Mais alguns momentos e mais canhões, até que todas as Sombras Mortais desapareceram, deixando apenas leves cinzas pairando no ar, em meio à neve que caía. Logo após acabar com a ameaça que rondava a ela e seus amigos, Lehvinia sentiu o poder de sua Aura iluminada esvair-se mansa e sutilmente. Respirou profundamente e fechou os olhos por um momento, buscando um breve relaxamento após a liberação intensa de sua força arcana. Era o tempo exato de seus batimentos cardíacos voltarem à pulsação normal. Demorou alguns segundos até que todos tivessem certeza de que podiam se levantar sem perigo de qualquer outro ataque iminente. Amarantys aproximou-se de Lehvinia, tocando em seu ombro.
- Você está bem? – perguntou a Arqueira Arcana.
- Sim. – respondeu a Maga com um sorriso singelo e um olhar de agradecimento pela preocupação de Amarantys. – Estou apenas um pouco tonta, mas é uma sensação normal.
- Fiquei muito admirada pela sua atitude. Você foi muito corajosa na decisão que tomou. – continuou Amarantys.
- Garota, você foi sensacional! – bradou Drakonyh, empolgado com a cena que tinha acabado de presenciar. Demonstrava certa excitação por toda situação que acontecera ali, enquanto caminhava em direção de Lehvinia e segurava sua mão. – Você tem estilo, e a maneira como você encarou o perigo! Eu gosto disso!
- Quanta empolgação desnecessária... – sussurrou Hevelin, no momento em que Mehldrik passava ao seu lado, que ouviu aquele comentário que a duelista claramente dirigia a Drakonyh. Ela parecia um tanto incomodada com aquela atitude meio espalhafatosa do espadachim, que não parava de elogiar Lehvinia, que também recebeu palavras de agradecimento do Guardião Arcano.
Vohldrik, que durante o ataque das Sombras Mortais, manteve-se agachado, mas segurando sua montante em posição de possível ataque, aproximou-se da Maga, fincando com cuidado sua enorme arma em um pequeno monte de neve formado ali. Sorrindo, estendeu a mão para Lehvinia em sinal de agradecimento. Não disse uma palavra sequer a ela, apenas continuou sorrindo, enquanto apertavam as mãos. A Maga retribuiu o gesto, lançando também um sorriso para o jovem guerreiro. Permaneceram os dois naquele breve momento de gratidão até que a voz um pouco tensa de Mehldrik os trouxe de volta para a perigosa realidade que os cercava naquele momento.

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Capitulo XIII

Mehldrik caminhava sozinho em meio à floresta coberta de gelo e dominada por aquele clima frio. Tentava se aquecer esfregando as mãos uma contra a outra, enquanto olhava ao redor com uma expressão confusa e desnorteada. Não fazia idéia de onde estava, e nem imaginava onde estavam todos os outros. Seu irmão Vohldrik, Hevelin, Lehvinia, todos haviam sumido, e ele não sabia do paradeiro deles. Andava olhando para os lados um pouco assustado com essa situação, tentando se lembrar onde e quando se perdeu, mas sua mente parecia entorpecida por um esquecimento repentino e estranho. A escuridão da noite foi dando lugar a um amanhecer manso e gélido. Nevava sutilmente quando ele avistou ao longe, entre as árvores, uma cabana, que lhe pareceu familiar. Era a cabana de seus pais, onde ele havia passado os melhores anos de sua infância. Uma sensação de nostalgia o dominou completamente, misturado a um sentimento de esperança, que inundou ainda mais seu espírito quando ele ouviu vozes ao longe, que pareciam vir da cabana. Seriam seus pais que haviam retornado enfim e estariam esperando pelos seus filhos? As vozes eram alegres, pareciam conversar animadamente, soltando risadas gostosas. Mehldrik parou por um instante, olhando para os lados. Soltou um sorriso, como se não acreditando em toda aquela situação. A cabana ainda estava um pouco distante, e a neve que caía dificultava um pouco a visão, mas ele conseguia enxergar pessoas na frente da cabana, conversando, rindo.
Começou a correr em direção à cabana. Não conseguia conter sua ansiedade em reencontrar seus pais. Mehldrik esperava por esse dia há muito tempo. As vozes ficavam mais próximas, e sua ansiedade só aumentava. A voz de seu irmão Vohldrik tornou-se clara, e então Mehldrik correu mais rápido ainda. Um arrebatamento alegre tomava conta de todo seu espírito, enquanto vencia toda aquela neve e corria por entre as árvores. Nada o impediria de reencontrar seu irmão e seus pais. Seu irmão gritava seu nome. Entretanto, Mehldrik percebeu algo estranho. Por mais que corresse em direção à cabana, não conseguia chegar. Seus passos começaram a ficar pesados, e suas pernas pareciam afundar mais e mais naquela neve toda. Seu irmão continuava gritando seu nome e acenava. Quando parecia se aproximar um pouco, então conseguiu visualizar um pouco mais a cena à sua frente, e o que viu foi tão atordoante que cessou seus passos de maneira instantânea. Seus pais e seu irmão não estavam conversando alegremente, mas pedindo ajuda desesperados, tentando se defender de gorilas brancos enfurecidos. Seu irmão continuava gritando, chamando seu nome insistentemente, enquanto Mehldrik, atônito, sentiu um desespero tomar conta de si. Tudo ao seu redor começou a se dissipar de maneira alucinante, como que levada por sopros gelados de uma nevasca repentina e violenta, girando sem parar. Já não enxergava mais nada, e só conseguia ouvir a voz de Vohldrik gritando seu nome sem parar.
Foi justamente nesse exato momento, onde realidade e sonho se confundem insistentemente, que Mehldrik acordou assustado, olhos arregalados, coração disparado, sendo pego de surpresa numa situação de alto risco. A angústia gerada pelo pesadelo agora foi substituída pela gravidade de perigo da realidade ao seu redor. Ao seu lado, a pequena fogueira que havia acendido na noite anterior já havia se consumido completamente, restando apenas cinzas. Todos haviam se levantado também assustados, correndo para a entrada da gruta. Ali próximo estava Vohldrik, cercado por um bando de gorilas brancos. Girando sua enorme montante em espirais rápidas, ele tentava se defender dos animais enfurecidos, enquanto gritava o nome de Mehldrik e dos demais, alertando-os para o perigo que havia se aproximado enquanto eles ainda dormiam.
- Temos que sair daqui rápido! – gritava o jovem guerreiro, de maneira ofegante – Eles são muitos, e estão vindo mais descendo aquela colina!
A visão era realmente bastante aterrorizante. Vários grupos de gorilas brancos desciam pelas encostas, pulando por sobre pedras, e se pendurando pelos galhos das árvores. Alguns, mais ágeis, davam saltos incríveis, de uma árvore para outra. Sem demora, Amarantys pulou sobre uma pedra, dando um salto acrobático para mais próximo de onde estava Vohldrik, ao mesmo tempo em que invocava seu arco astral, descarregando com extrema rapidez vários disparos de flechas das sombras contra os gorilas que se aproximavam enraivecidos.
- Corram enquanto tento retardá-los um pouco! – Amarantys fez um sinal apontando à sua direita, onde havia uma trilha descendo logo após a gruta. Todos seguiram a orientação da arqueira e correram para o local indicado, menos Drakonyh, que com passos largos foi em direção de onde estava a arqueira. – O que você faz aqui, seu louco?
- Você acha que eu iria perder essa oportunidade? – disse o espadachim, soltando um sorriso, antes de correr na direção dos gorilas. – Isso aqui vai ser muito divertido!
Enquanto Amarantys continuava disparando de maneira frenética suas flechas sombrias, Drakonyh saiu em disparada, e com movimentos rápidos chegou o mais próximo que podia da horda de gorilas. Empunhando sua espada de lado, Drakonyh parou e olhou fixamente para o primeiro grupo de monstros bem à sua frente. As pupilas de seus olhos sutilmente desapareceram por detrás de retinas prateadas, enquanto ele levantava sua mão esquerda, centralizando seu poder astral no cristal que estava preso a ela. Como que em transe, Drakonyh canalizou toda sua energia em seu pulso, lançando-a como um pó maligno e letal contra os gorilas, enfraquecendo o máximo que podia os seus movimentos. Ele havia fragilizado toda a defesa dos perigosos animais, que sentiram todas as suas forças e agilidades serem substituídas momentaneamente por uma sensação profunda de torpor.
- Aproveite ao máximo, Amarantys! – gritou Drakonyh – Eu enfraqueci os dois grupos da esquerda. Dispare contra eles enquanto eu cuido dos que estão à direita.
Amarantys concordou, e então mirou seu arco na direção dos gorilas entorpecidos, disparando várias flechas astralmente envenenadas. Enquanto lançava os projéteis venenosos, uma névoa verde oriunda do veneno se formava ao redor da arqueira, envolvendo-a momentaneamente, até dissipar-se completamente no vácuo das flechas lançadas. Do outro lado, Drakonyh, ainda em transe, continuava enfraquecendo os monstros em seu redor, e utilizando a técnica da dança da ruína, saltando habilmente em cima dos gorilas, atacando com extrema força com sua espada. Todos os monstros enfurecidos ao seu redor foram caindo diante de sua luta determinada. Por todo lado apenas ouvia-se rugidos ferozes dos gorilas. Assim que o último peludo branco caiu diante de seus pés, e passado o estado momentâneo de êxtase, Drakonyh virou-se e estreitou seu olhar para a colina acima, enxergando dezenas de gorilas descendo pela montanha. Eram muitos, pulando pelas árvores, correndo alucinados para cima do espadachim arcano. Amarantys percebeu a gravidade da situação ao avistar Drakonyh, e soltou algumas flechas envenenadas na direção dos gorilas que corriam para cima dele.
- Drakonyh! Vamos embora! Já não podemos dar conta de todos! – gritou a arqueira, um pouco nervosa.
- Justo agora que estava começando a ficar excitante? – retrucou o espadachim com um expressão visivelmente contrariada.
- Pare de falar besteiras e corra!
Os dois seguiram em disparada para a trilha indicada pela arqueira e na qual os demais já haviam seguido minutos antes.
- Eu já te disse que você realmente não sabe como aproveitar a vida? – perguntou Drakonyh visivelmente chateado. – Podíamos dar conta de todos aqueles gorilas num piscar de olhos.
- E eu já te disse que você é um maluco perturbado? – revidou Amarantys, enquanto corria por entre as árvores, buscando pegar a estreita trilha que seguia por entre um vão nas rochas.
- Admita, depois que nos conhecemos, sua vida ficou mais cheia de desafios. Sinta só o perigo às nossas costas! – Drakonyh soltava urros de alegria, enquanto sorria descaradamente para Amarantys, que algumas vezes chegava mesmo a considerar a possibilidade de que aquele espadachim arcano que conhecera há algum tempo atrás era um louco que sentia prazer em desafiar perigos acima de seu próprio limite humano.
Chegaram à trilha estreita e passaram por ela. Atrás deles, os gorilas se amontoavam numa corrida desembestada em busca de suas vítimas, correndo e pulando uns sobre os outros, urrando sem parar. A trilha que pegaram se afinulava numa passagem única por entre rochas escuras, sem qualquer outro retorno visível. Não demorou muito, e o caminho estreito terminou abruptamente, dando lugar a um pequeno desfiladeiro coberto de neve. Desceram pela encosta, e no meio do caminho já podiam avistar Mehldrik, Vohldrik, Hevelin e Lehvinia, todos parados à beira de um lago congelado. Não demorou muito e já estavam todos reunidos novamente.
- Por um momento, pensamos que vocês não haviam escapado dos gorilas. – disse Lehvinia com expressão preocupada.
- Conseguimos retardar um pouco eles, mas são muitos, e ainda devem estar atrás de gente. – explicou Amarantys.
- São muitos, mas poderíamos ter dado conta da maioria, se não tivéssemos fugido. – a leve firmeza nas palavras de Drakonyh fez todos olharem para ele com um confuso ar de espanto. Ele percebeu os olhares e desconversou no mesmo instante. – Bom, fugimos, mas pelo menos derrubamos uma boa quantidade daqueles monstros peludos e branquelos. – disse, sorrindo sutilmente.
- Agora temos que nos preocupar em como sairemos daqui. – disse Mehldrik, preocupado. – Não podemos voltar pelo caminho por onde viemos por causa dos gorilas, e estamos diante de um lago congelado.
- Essa nevasca não deixa a gente ver o outro lado do lago. – Vohldrik olhava insistentemente para além do lago, tentando enxergar alguma paisagem que pudesse definir a outra margem do lago.
- Não podemos ficar parados aqui muito tempo. O tempo está piorando e ficarmos conversando aqui não vai resolver nada. – Hevelin estava visivelmente chateada com a situação na qual se encontravam no momento. A gente errou no caminho que tomamos ao fugirmos. Podíamos ter sido mais precisos e menos precipitados sobre o que devíamos ter feito na hora.
- Peço desculpas, Hevelin, mas eu não conheço muito bem a região, e quando apontei uma opção de fuga, eu dei a primeira saída que visualizei para todos. Não me interprete mal, mas não tenho culpa se viemos parar em cima de um lago congelado.
Amarantys tentava se explicar, pois tinha a impressão de que aquelas palavras de Hevelin pareciam ser direcionadas a ela, afinal de contas, foi a própria Amarantys quem indicou um caminho para a fuga. Mehldrik pediu um pouco mais de calma a todos, e olhou ao redor. Avaliou a situação a partir exatamente do ponto onde estavam. Atrás deles havia o desfiladeiro coberto de neve por onde desceram, e lá em cima, a trilha estreita entre as rochas, por onde haviam escapado. Voltar por ali era improvável, e permanecer naquela beirada íngreme era perigoso. Mehldrik percebeu que havia descido por uma parte acidentada de uma pequena montanha, e seria muito trabalhoso tentar escalar aquelas rochas. Constatou que a única saída seria realmente atravessar o lago congelado.
- Pessoal, nossa única alternativa realmente é seguir em frente, atravessando o lago. Não podemos mais ficar parados aqui. Parece que a nevasca está piorando.
- Então temos que nos apressar. – disse Vohldrik. – Posso estar errado, mas acho que ouvi os urros dos gorilas agora há pouco.
Todos fizeram silêncio, e apesar do som incessante dos ventos frios, possíveis prenúncios da nevasca que estava por vir, dava para ouvir um som em princípio tímido, mas que parecia aproximar-se cada vez mais. Os gorilas estavam se aproximando de fato.

sábado, 23 de maio de 2009

Capitulo XII

Enquanto observava atentamente aquele zumbi desaparecer por completo diante de si, Mehldrik protegia-se com seu escudo astral das cinzas que se dissipavam diante de seus olhos. Antes que pudesse raciocinar direito sobre o que realmente havia atingido aquele zumbi, uma sequência rápida de flechas das sombras foi disparada contra a horda perigosa que continuava rastejando em sua direção. Um a um, vários zumbis à sua frente foram aniquilados completamente, virando cinzas no ar. Mehldrik olhou na direção de onde as flechas estavam sendo lançadas, e viu, em meio às árvores, a silhueta de uma pessoa que empunhava um arco astral.
- Mas quem está disparando essas flechas sombrias? – perguntou Vohldrik, surpreso, enquanto observava os zumbis desaparecerem bem diante de seus olhos.
- Não tenho certeza, mas acabei de ver um arqueiro entre as árvores. – respondeu Mehldrik.
- Você consegue enxergar quem é, Mehldrik? – perguntou Lehvinia.
- Não, o local de onde ele está atirando está meio escuro. Só consigo ver uma silhueta na penumbra. E ele continua atirando.
- Não sei se vocês perceberam, mas tem mais zumbis vindo ao nosso encontro. São muitos, acho melhor a gente conversar menos e agirmos de uma vez. – Hevelin estava realmente impaciente para se livrar daquela horda de zumbis. Eles estavam aparecendo em um número cada vez mais crescente. Quando Hevelin estava partindo para cima de um grupo de zumbis à sua frente, alguém repentinamente saltou em sua frente, de forma ágil e com movimentos rápidos começou a atacar os zumbis. Todos se voltaram meio assustados para aquela nova aparição, dando saltos e piruetas de maneira incrivelmente precisos. E pela maneira como empunhava sua espada em uma de suas mãos, tendo a outra equipada com um cristal astral, tratava-se de um Espadachim Arcano. Assim como o arqueiro, ele escondia o rosto sob um capuz, dificultando sua identificação naquele instante.
- Acho que vocês estão realmente no lugar errado. – disse o Espadachim, sem olhar para trás.
- Mas o que é isso? – disse Hevelin, dando um passo para trás, meio contrariada por ter sido atrapalhada em sua investida contra os zumbis.
- Um Espadachim arcano – respondeu Lehvinia com um sorriso.
- Eu sei que é um espadachim arcano! – retrucou Hevelin, nervosa – Eu quero saber de onde ele surgiu e o que ele está fazendo aqui.
- Eu não sei quanto a vocês, mas acho melhor dar uma ajuda a eles. – disse Vohldrik, enquanto levantava sua montante e partia para cima dos zumbis.
Mehldrik concordou com as palavras do irmão, e então decidiram atacar. Havia muitos grupos de zumbis aparecendo por toda parte, e eles se dividiram para acabar com as hordas que se arrastavam perigosos na direção do grupo. Vohldrik potencializou toda a sua força utilizando o golpe da Condenação Espiral, um ataque mortal rodopiando sua montante em espiral, acertando todos os inimigos em seu redor. Entretanto, um ou dois zumbis não eram atingidos, o que fazia com que Vohldrik utilizasse outro golpe conhecido como Queda Livre, dando um salto giratório no ar e na descida, cravando a montante no chão para em seguida acertar mortalmente o oponente de frente. Perto do jovem guerreiro, Lehvinia tentava manter aqueles seres sinistros distantes, lançados diversos projéteis em sequência contra eles. Utilizando um orbe em cada mão que potencializa de maneira concentrada sua força arcana, Lehvinia canalizava suas técnicas de magia, soltando-as ora com as duas mãos, ora com apenas uma delas. Dessa forma, ela lançava projéteis de gelo e fogo em lances alternados, derrubando diversos zumbis que vinham ao seu encontro. Para se proteger, em determinados momentos, aplicava em si mesma uma aura astral de defesa. Enquanto Lehvinia mantinha aqueles monstros longe de seu alcance, Mehldrik desferia seus golpes circulares com sua katana, para em seguida desferir também seus projéteis relâmpagos mortais de seu escudo astral contra os zumbis. Já Hevelin não perdeu tempo em projetar-se em sua espiral fantasma juntamente com sua técnica do Corte da Lua Gêmea, finalizando com seus dois golpes cruzados com suas katanas. Dessa forma, pouco a pouco as hordas de perigosos zumbis estavam sendo dizimadas pelos jovens guerreiros através de suas diversas forças arcanas. Entretanto, o espadachim arcano e o arqueiro estavam atacando os zumbis de uma forma diferente, como se não quisessem que eles sumissem em cinzas por completo. Empunhando apenas sua espada, o espadachim demonstrava total precisão em seus ataques. Em alguns momentos, ele simplesmente parava, e passava sua mão equipada com o cristal na lâmina de sua espada, concentrando dessa forma força arcana mágica na mesma. Hevelin, ofegante pela sequência de golpes desferidos, resguardou-se em uma pausa para respirar, e nesse meio tempo conseguiu ver o espadachim misterioso invocando as chamadas técnicas mágicas de espada, onde ele reunia as técnicas de magia e de espada em golpes únicos e precisos, causando assim maior dano aos inimigos. Partia para cima dos zumbis utilizando a técnica da Dança da Ruína, saltando em direção ao inimigo, atacando com incrível força e precisão de golpe. Movimentando-se de forma quase instantânea, partia para outros oponentes, atacando-os enquanto deslizava velozmente pelo espaço, parecendo teleportar-se no ar, num outro golpe conhecido como Assalto Astral. O arqueiro permanecia distanciado, ajudando-o, concentrado em suas rajadas de flechas sombrias, como que preocupado em não estraçalhar completamente os corpos desfigurados dos zumbis.
Em determinado momento, ouviu-se pela primeira vez a voz do espadachim, em tom de ordem, gritando na direção do arqueiro. Todos os outros, enquanto lutavam, espantaram-se com aquele grito repentino.
- Não atire! Não atire! Ele é o último! Vou tentar pegar dele – gritava o espadachim para o arqueiro, que nesse momento parou de lançar suas flechas astrais. Melhdrik e os demais ficaram sem entender exatamente o que aqueles dois estranhos estavam tentando fazer. Haviam derrubado todos os zumbis, e restava apenas aquele, diante do espadachim imóvel em posição de ataque. Então, tão veloz quando antes, deslizou na direção daquela monstruosidade, desferindo um golpe único de sua espada no crânio semi esfacelado do zumbi, porém mantendo-o seguro pela lâmina, por onde, lentamente, começou a descer um filete de sangue. Agilmente, com a outra mão livre, o espadachim puxou de um pequeno alforje preso em sua cintura um minúsculo frasco transparente, com o qual coletou uma pequena amostra do sangue daquela criatura sinistra. Assim que o frasco encheu-se daquele líquido viscoso de cor avermelhada, ele o fechou e guardou novamente no alforje. O corpo daquele zumbi, que permanecia suspenso pela espada cravada em seu crânio, se contorcia em espasmos, quando o espadachim novamente soltou uma nova ordem para o arqueiro.
- Agora! Atire! – ordenou.
O arqueiro soltou um disparo sombrio, e a flecha foi certeira no alvo, aniquilando completamente o último zumbi, até sobrarem apenas cinzas esvoaçantes ao redor do espadachim. Após se livrarem de toda aquela horda de seres horrendos, Mehldrik, Vohldrik, Hevelin e Lehvinia se aproximaram do espadachim, buscando saber o que realmente eles estavam fazendo ali.
- Estamos agradecidos por nos ajudar com aqueles zumbis – disse Mehldrik, dirigindo-se ao Espadachim, que virou-se para eles, tirando enfim o capuz que cobria sua cabeça. Era um jovem de pele morena e de olhos negros, assim como seus cabelos. De estatura mediana e magro, tinha uma desenvoltura física esbelta, que havia sido demonstrada pelos seus gestos e movimentos flexíveis durante o combate com os zumbis. Seu nome era Drakonyh.
- Não precisa agradecer. Não estávamos ajudando vocês. – respondeu com um sorriso no canto da boca, enquanto limpava sua espada suja com resquícios de sangue dos zumbis. Todos fizeram certo ar de espanto com aquela resposta. Em princípio, não compreenderam aquelas palavras ditas por Drakonyh, que ao perceber o leve incômodo causado pela sua resposta, procurou remediar a situação. – Olha, desculpe a franqueza, mas realmente eu e minha amiga já estávamos aqui pelas redondezas quando vocês apareceram.
- Amiga? – perguntou Vohldrik meio em tom de surpresa. – Então quem estava atirando aquelas flechas sombrias era uma garota?
- Exatamente. – respondeu uma voz feminina. Era a arqueira, amiga de Drakonyh, aproximando-se do grupo. Saiu de trás das árvores onde estava, descendo uma pequena trilha na neve até onde todos se reuniram. Ainda segurando seu arco astral invocado antes da batalha, retirou o capuz da cabeça com uma das mãos, revelando seus lindos e ondulados cabelos ruivos, de um vermelho vivo e intenso e um sorriso enigmático e cativante, e não demorou-se em fazer as apresentações. – Eu sou Amarantys, do condado de Areshand, e este é meu amigo Drakonyh, de Spine. Somos do Continente de Pastur.
Enquanto todos se apresentavam amigavelmente, Drakonyh terminava de limpar cuidadosamente sua espada, para em seguida procurar novamente pelo conteúdo guardado no minúsculo frasco transparente que estava em seu alforje. Assim que todos terminaram de se apresentar, Drakonyh decidiu então explicar realmente o que eles faziam ali por aquelas terras do Clã dos Mortos-Vivos.
- Como eu havia dito, nós já estávamos aqui pelas redondezas dessa área antes de vocês aparecerem.
- Mas o que exatamente vocês fazem aqui por estas terras? – perguntou Mehldrik, ainda intrigado.
- Estamos caçando zumbis. – respondeu Amarantys.
- Caçando zumbis? – Lehvinia ficou intrigada com aquela resposta. – Mas qual o objetivo de vocês em caçarem zumbis?
- Estávamos atrás disso aqui. – Drakonyh mostrou o pequeno frasco transparente contendo uma amostra de sangue do zumbi. Examinava o minúsculo recipiente apoiado levemente em seus dedos bem próximo aos seus olhos. – Esse é o motivo real de estarmos aqui nesse fim de mundo sinistro.
- Desculpe, mas ainda não estou realmente entendendo. – insistiu dessa vez Hevelin, que não estava gostando muito daquele sorriso estampado no rosto de Drakonyh. Ela realmente não simpatizou com aquele espadachim arcano. – Vocês vieram aqui atrás de sangue de zumbi?
- Na verdade, não somos nós que estamos atrás desse sangue de zumbi. Eu e Drakonyh estamos aqui em missão, a pedido do Instrutor O’Conner, do condado principal de Tundra Infame.
- O’Conner enviou vocês em uma missão? – indagou Vohldrik – Mas porque coletar sangue de zumbis?
- De acordo com as explicações dadas por O’Conner, esses monstros do Clã dos Mortos-Vivos que vagam por cemitérios e outras áreas isoladas das montanhas de Tundra Infame se tornaram mais violentos nos últimos tempos. Além disso, a quantidade deles tem aumentado de maneira estranha, e eles têm invadido os limites das colônias da região. – enquanto conversava com todos, Amarantys levantou a mão que segurava seu arco astral, concentrou-se rapidamente, e em seguida seu arco retraiu-se até tornar-se um pequeno cristal de duas pontas preso em seu punho. – Com isso, os incidentes com os moradores ficaram mais freqüentes.
- De fato, isso tem ocorrido muito ultimamente, os zumbis começaram a aparecer em lugares onde antes eles nem sequer pisavam. – comentou Mehldrik.
- Justamente por causa desse comportamento anormal que esses monstros vêm demostrando é que O’Conner solicitou nossa ajuda para que capturássemos um zumbi e assim coletarmos uma amostra de seu sangue para que ele possa ser examinado pelos especialistas do condado. – Drakonyh complementou a explicação de Amarantys, e novamente guardou o pequenino frasco com a amostra em seu alforje. – Agora que já cumprimos nossa missão, devemos retornar para o Condado para entregar a amostra que conseguimos.
Mal terminou sua frase, e Drakonyh sentiu um vento gelado começar a soprar atrás de si. Olhou para o alto e percebeu que começava a nevar. Além disso, estava começando a anoitecer, e a luz diurna começava a sumir gradativamente, dando lugar a uma penumbra cada vez mais escura. Estreitou o olhar e balançou a cabeça negativamente. Assim como Mehldrik, Drakonyh também não gostava muito daquele clima frio e daquelas nevascas que pareciam nunca terminar por aquelas montanhas geladas. Olhou para Amarantys com uma expressão desolada.
- Já sei, não precisa me dizer nada. Vamos tratar de procurar um abrigo e passar a noite. Mas amanhã cedinho quero sair dessas montanhas de neve. Não agüento mais ver tanta neve ao meu redor. – Drakonyh virou-se, levantou o capuz sobre sua cabeça e saiu andando, resmungando sozinho. – Que lugar sinistro, só faz nevar, nevar. Desde que cheguei aqui nesse continente, ainda não vi um dia ensolarado sequer.
- Não se preocupem com ele. – disse Amarantys sorrindo – Drakonys costuma resmungar um pouco além da conta, mas ele não é assim o tempo todo. A propósito, o que vocês fazem aqui por essas terras? Eu estava curiosa em saber, e assim que os vi, imaginei que vocês também estivessem caçando zumbis para coletar amostras de sangue.
- Não estamos caçando zumbis. – respondeu Mehldrik – Antes de encontrar aquela horda de monstros, estávamos seguindo o rastro deixado por alguém.
- Mas eu acredito que agora já não encontraremos mais ninguém, Mehldrik – disse Lehvinia – Com essa neve começando a cair, não demora muito e o rastro deixado por Skaild terá sumido.
Mehldrik afastou-se um pouco do grupo, e caminhou olhando para o chão, procurando vestígios do rastro que estavam seguindo. Agachou-se e apalpou a neve levemente, pegando um punhado em sua mão, enquanto ponderava sobre o que realmente deveriam fazer. Caso decidissem não mais seguir os rastros de Skaild, Mehldrik tinha a perfeita noção de que estaria perdendo a oportunidade única de elucidar parte do mistério dos desaparecimentos em Nevareth, e isso significava que o desaparecimento de seus pais continuaria também parte de todo esse mistério. Ao chegar a essa conclusão, Mehldrik sentiu um aperto gelado no coração. Fechou o punho, esmagando o pouco de neve que tinha na mão.
- De fato, você tem razão, Lehvinia. Essa neve caindo já deve estar encobrindo os rastros deixado por Skaild.
- Acho melhor então voltarmos para o condado. – disse Hevelin – Precisamos informar aos Oficiais do Condado tudo o que descobrimos naquela mina, inclusive a respeito de Skaild.
- E eu e Lehvinia devemos retornar também ao encontro do Capitão Mark, para relatarmos todo o ocorrido aqui. – complementou Vohldrik.
- Já que vocês estão retornando, podemos voltar juntos – sugeriu Amarantys – Seria até mais seguro para todos, já que estamos ainda em uma região perigosa e não sabemos se encontraremos mais zumbis ou não.
Todos concordaram com a idéia de Amarantys, seguindo o caminho de volta para o Condado Principal de Tundra Infame. Já havia anoitecido e a nevasca tornara-se mais intensa, quando finalmente encontraram um abrigo em uma pequena gruta na encosta de uma montanha.

terça-feira, 17 de março de 2009

Capitulo XI

O breu que envolvia Mehldrik e Hevelin naquela pequena reentrância na rocha soterrada pela avalanche era uma escuridão angustiante e sufocante. Era preciso sair dali logo antes que eles acabassem ficando sem ar. Mehldrik invocou novamente seu escudo astral, já que na fuga desesperada ele o tinha recolhido e guardado em seu alforje. Agora o brilho do escudo iluminava fracamente o interior da minúscula gruta onde estavam. Pedia a Hevelin que se afastasse um pouco.
- O que você pretende fazer? – perguntou a duelista, ainda ofegante.
- Vou tentar tirar a gente daqui antes que a gente sufoque.
- Você está maluco? – questionou Hevelin nervosa. – Estamos soterrados, e você quer nos enterrar mais ainda?
- Hevelin, eu sei dos riscos, mas temos que sair desse buraco de algum jeito!
- E você acha que essa é a melhor maneira, por acaso? – retrucou a Duelista.
- Você tem alguma idéia melhor no momento? – Mehldrik encarou Hevelin fixamente nos olhos por alguns momentos. O tom de voz do guardião era desafiador. – Não se preocupe, tomarei cuidado para não cometer algum erro que acabe com nossas vidas aqui.
Mehldrik mirou o escudo em direção à entrada soterrada e soltou um projétil de fogo. Parecia estar dando certo, pois a neve acumulada estava se afastando, abrindo espaço para uma possível saída. O Guardião tomou cuidado em não soltar projéteis com muito poder, para não provocar novos deslizamentos e soterrá-lo ainda mais debaixo de novas camadas de neve. Soltou mais dois projéteis de fogo em intervalos regulares de tempo, e ao ver finalmente um fio de claridade adentrar um minúsculo buraco no meio daquela neve toda, ele decidiu soltar um último projétil mais forte, cujo poder de fogo acabou provocando um rombo, abrindo caminho finalmente para fora daquela pequena gruta. Conseguiram sair e olharam ao redor, começando a ter uma visão total de todo o estrago provocado pela avalanche que desceu pela montanha. Hevelin acabou sentando na neve fofa, enquanto Mehldrik observava silencioso por alguns instantes toda a área que estava soterrada.
- Você tomou uma atitude muito arriscada. A gente poderia não estar vivo agora, caso desse errado. – disse Hevelin, meio contrariada.
- Era um risco que corríamos. Ou isso, ou morreríamos sufocados lá dentro.
Mehldrik permanecia investigando os locais próximos da avalanche, tentando encontrar possível sinal da presença de Skaild pelas redondezas.
- Será que Skaild conseguiu se salvar? – perguntou Hevelin.
- Eu espero que sim. Do contrário, tudo o que fizemos aqui terá sido em vão. – respondeu Mehldrik, enquanto via a nevasca cessando gradualmente. – Precisamos encontrá-lo e levá-lo para o Condado Principal.
- E se ele conseguiu escapar da avalanche?
- Se conseguiu, com certeza não deve estar muito longe. Podemos alcançá-lo e acompanhá-lo até o condado.
- Você acredita que ele possa estar mesmo retornando para o Condado, como você o orientou a fazer, caso escapasse?
- Não tenho certeza que ele retorne sozinho. Por isso devemos encontrar ele e acompanhá-lo até o Condado.
Após dizer isso, Mehldrik observou movimentação em uma parte não muito distante da montanha, do local onde estavam. Ficou intrigado e chamou Hevelin para mostrar o que estava vendo.
- Consegue ver ali? Naquela parte da montanha.
- Acho que sim... Parece ser duas pessoas, e estão se movendo com certa rapidez, eu diria até.
- Eu também percebi isso. Um deles parece estar utilizando técnicas de teleporte para se deslocar.
- Se isso for verdade, então creio que deva ser um Mago. O outro não se desloca por teleporte, mas se move também de maneira ágil pelo caminho. Pelo estilo e desenvoltura, parece ser um guardião, ou um guerreiro. Não tenho certeza.
- Creio que estão vindo em nossa direção. – disse Mehldrik
- Serão membros da Guilda dos Ladrões e estão nos procurando?
- Não parecem bandidos... E acho que já nos viram.
Mehldrik e Hevelin ficaram apenas observando enquanto as duas pessoas se aproximavam rapidamente do local onde estavam. A primeira a chegar foi Lehvinia, que parou diante de Mehldrik, que permanecia imóvel aguardando o primeiro contato, que não demorou muito.
- Olá, eu me chamo Lehvinia. – disse a maga, de maneira contida e diplomática. – Estamos procurando por alguns guerreiros que foram soterrados na avalanche.
- Então você acaba de nos encontrar. Eu sou Mehldrik e esta é minha amiga Hevelin. Estávamos em uma missão importante e...
- Espere um instante – interrompeu Lehvinia, com ar de surpresa em seu rosto. – Você disse que seu nome é Mehldrik?
- Isso mesmo. Por quê? – questionou o guardião, curioso.
- Lehvinia perguntou porque ela já ouviu falar de você, e muito bem. – respondeu Vohldrik, que tinha acabado de chegar a tempo de ouvir parte da conversa. Estava parado ao lado de uma pedra, com um sorriso no rosto e feliz por reencontrar o irmão naquele momento.
- Vohldrik! – o guardião ficou surpreso, para logo em seguida sorrir.
Abraçaram-se de maneira saudosa sob os olhares atentos de Lehvinia e Hevelin, e trocaram palavras rápidas a respeito das aventuras que tiveram, do que fizeram e por onde andaram. Tinham muito que contar um ao outro, mas naquele momento Vohldrik estava mais interessado em saber como e porquê seu irmão se envolveu naquela situação toda.
- Eu e Hevelin nos conhecemos recentemente e estávamos em missões distintas, mas resolvemos nos unir, pois chegamos à conclusão de o nosso destino era o mesmo. – explicava Mehldrik – Conseguimos localizar o esconderijo da Guilda dos Ladrões aqui nessa montanha, e depois de resgatarmos uma pessoa, procuramos fugir o mais rápido possível.
- Mas e a avalanche? – perguntou Lehvinia, apesar de já saber parte da história contada por Skaild.
- A avalanche foi provocada por Mehldrik. – respondeu prontamente Hevelin – Os ladrões estavam atrás da gente, e logo encontramos uma matilha enorme de lobos zumbis. Então Mehldrik teve a idéia de provocar o desmoronamento.
- Mas espere um instante? – Mehldrik teve um lampejo de dúvida - Como vocês souberam que nós poderíamos estar soterrados aqui na neve?
- Skaild, a pessoa que vocês resgataram que nos contou. – disse Vohldrik.
- Vocês encontraram Skaild? – questionou o guardião com certo espanto.
- Sim, nós o encontramos momentos antes de ser enterrado pela avalanche, e o tiramos debaixo da neve. Eu ministrei cura nele, e assim ele pôde nos contar o que havia acontecido e nos falou de vocês dois.
- E onde ele está?
- Ele seguiu o caminho para o Condado Principal, disse que precisava chegar lá o quanto antes, pois não queria ser pego novamente pela Guilda. – explicou Vohldrik.
- Precisamos alcançá-lo e escoltá-lo em segurança até o Condado. – explicou Mehldrik, com certa tensão em sua voz.
- Por que toda essa preocupação com relação a Skaild? – perguntou Lehvinia. – Ele não é apenas mais um fugitivo da Guilda?
- Na verdade, não. Ele não é apenas mais um fugitivo... – respondeu Mehldrik vagamente.
- Como assim? – questionou Hevelin, olhando para o guardião e percebendo que ele escondia algo mais a respeito de Skaild. – Você me disse que estava tentando resgatar alguém que estava sendo ameaçado de morte pela Guilda por causa de dívidas. Tem algo mais que você não me contou a respeito de Skaild?
Mehldrik permaneceu em silêncio por alguns momentos, mas logo percebeu que todos o estavam olhando, como que esperando por respostas ou alguma explicação a mais. Então decidiu contar o que sabia a respeito de Skaild. Explicou que tinha aceitado a missão a pedido do amigo Simon, e que este havia lhe contado que muito provavelmente Skaild teria informações que seriam importantes para elucidar parte do mistério do desaparecimento de pessoas que vinham ocorrendo pelos continentes de Nevareth. Após relatar tudo sobre sua missão, todos o olharam com enorme espanto, principalmente Vohldrik, que parecia saber dos verdadeiros motivos que levaram o irmão a aceitar aquela missão perigosa. Por um breve momento, os irmãos se entreolharam e puderam saber exatamente o que cada um pensava a respeito daquela situação toda.
- Quer dizer que Skaild tem informações que podem desvendar todo o mistério dos desaparecimentos? – perguntou Lehvinia, intrigada.
- Segundo as informações que me foram passadas, sim.
- Então isso explica o motivo pelo qual você tinha tanta pressa em encontrar Skaild e o levar de volta em segurança ao Condado. – disse Hevelin, enquanto meditava suas próprias palavras.
- Por isso precisamos alcançá-lo o quanto antes e levarmos ele em segurança de volta ao Condado. Temos que ir.
Mehldrik se preparava para descer a montanha quando Vohldrik parou diante do irmão, que ficou meio assustado com aquela atitude.
- Mehldrik, espera um pouco. Vocês invadiram aquela mina, então você e Hevelin podem nos dizer exatamente se havia um líder presente entre eles? – questionou Vohldrik.
- Líder? De quem você está falando exatamente?
- Estamos falando de Kashu.
- Não posso dar a você certeza dessa informação, mas enquanto invadíamos a mina, não vimos nenhum sinal de Kashu por lá. E acredito que agora seja impossível descobrir se ele estava naquela mina, já que ela está completamente soterrada pela neve. Mas por que você está querendo saber sobre Kashu?
- Viemos aqui a Midreth a pedido do Capitão Mark, para encontrar Kashu. – respondeu Vohldrik.
- O que? – Hevelin estava surpresa com o que acabava de ouvir – O Capitão Mark enviou vocês para encontrar Kashu?
- Sim, ele nos enviou nessa missão em caráter de urgência, e nos indicou justamente uma mina abandonada como possível refúgio secreto de Kashu. – explicou Lehvinia.
- Nesse caso, tanto o Capitão Mark quanto o Oficial Henkoff estavam certos em suas suspeitas com relação ao local onde a Guilda permanecia escondida. – disse Hevelin.
- Se Kashu estava naquela mina ou não, não saberemos. Se ele realmente estava, então ele foi soterrado e enterrado com todos os ladrões que estavam com ele lá. – Mehldrik olhou para o céu, encarando o tempo, pois tinha receio que uma nova nevasca começasse a cair e acabasse apagando qualquer trilha deixada por Skaild. – Precisamos ir antes que uma nova tempestade de neve venha a cair e apague o rastro deixado por Skaild.
- Mehldrik, eu e Lehvinia vamos acompanhar você e Hevelin até as proximidades do Condado de Tundra Infame, e em seguida partiremos para levar as informações que obtivemos aqui até o Capitão Mark.
- Meu irmão, será muito bom ter a sua companhia durante essa jornada, mesmo que por um curto período de tempo. – disse Mehldrik, apoiando a mão no ombro de Vohldrik. Só nesse momento, Lehvinia voltou a observar novamente a baixa estatura de Vohldrik, dessa vez em relação ao seu irmão mais velho. Sorriu singelamente olhando para os dois, enquanto Hevelin a observava, meio sem entender o motivo daquele sorriso.
Desceram pela montanha com extremo cuidado, até o ponto onde o jovem Guerreiro e a Maga haviam encontrado Skaild. Logo encontraram uma pequena trilha de pegadas que começava justamente no local onde haviam se despedido do ex-refém da Guilda dos Ladrões. Apesar dos constantes ventos gelados soprando por todos os lados, aproveitaram o tempo nublado e sem neve caindo para seguir a trilha, antes que ela sumisse completamente. Caminharam durante algumas horas, sempre seguindo os passos de Skaild deixados na neve, até que em determinado ponto Mehldrik parou para examinar mais de perto as pegadas. Olhou ao redor, buscando saber exatamente a direção que aquelas pegadas estavam tomando naquele ponto. Depois de observar durante certo tempo o rumo que estavam indo, acabou concluindo que Skaild não tinha ido em direção ao Condado, como havia prometido a ele.
- Ele mentiu para a gente! – disse Mehldrik, nervoso. – Ele disse que iria para o Condado, mas tomou outro rumo.
- Talvez ele tenha tomado um outro caminho para fugir dos lobos zumbis, ou dos pantrocornes. – sugeriu Hevelin.
- Não acredito que ele estivesse fugindo de matilhas de lobos zumbis. – questionou Lehvinia, enquanto olhava a trilha de pegadas na neve – O padrão é o mesmo desde o início, e não há indícios de que ele estivesse correndo ou fugindo. A distância entre as pegadas é a mesma.
- Não, ele não estava fugindo de nada. Além disso, já estamos consideravelmente longe do caminho que segue para o Condado. – O guardião caminhou um pouco e apontou uma direção – O Condado fica naquela direção, a nordeste, e nós estamos caminhando para o noroeste, nesta direção. Skaild tomou este rumo propositadamente.
- Mas para onde Skaild pode ter ido, então? – perguntou Vohldrik.
- É o que iremos descobrir seguindo a trilha deixada por ele. Precisamos nos apressar, antes que anoiteça.
Os quatro jovens continuaram seguindo aquela trilha que seguia agora para noroeste. Começava a entardecer, e logo seria noite. Continuaram a jornada, e depois de ouvirem alguns lobos uivando ao longe, passaram pela entrada de uma outra mina abandonada. Havia muitas minas abandonadas espalhadas não apenas nas Montanhas de Vahour, mas em diversas outras montanhas. Muitas dessas minas foram totalmente abandonadas depois que os Zumbis, monstros pertencentes ao Clã dos Mortos-Vivos que vivem isolados em determinadas áreas das montanhas de Tundra Infame, começaram a invadir os locais e ameaçar os trabalhadores. Muitos temiam serem capturados e transformados em zumbis, e então largavam tudo e voltavam para o Condado. As autoridades locais viam o Clã dos Mortos-Vivos como um verdadeiro estorvo para o desenvolvimento econômico da região, e não mediam esforços em repelir e isolar cada vez mais os zumbis para regiões cada vez mais distantes dos condados e das comunidades. E parece que Mehldrik, Vohldrik, Lehvinia e Hevelin estavam caminhando justamente em direção a essas áreas isoladas. Ainda seguindo a trilha deixada por Skaild, depois de terem passado pela mina abandonada, atravessaram um largo portal de pedra em arco. Caminhavam cada vez mais para dentro daquela região. Passaram por um cemitério, desviando de diversos túmulos com cruzes esculpidas em pedra branca, e não demorou muito para avistarem pelas redondezas algumas cabanas abandonadas e completamente em ruínas, com buracos no teto, portas e janelas caindo aos pedaços e madeira podre por todo lado. Na verdade, tinham acabado de chegar numa pequena vila abandonada. A trilha deixada por Skaild atravessava aquela vila. Mehldrik seguia na frente do grupo quando parou após ouvir um ruído estranho vindo das redondezas. Pareciam gemidos.
- Eu acho realmente que não estamos sós aqui. – disse Mehldrik, enquanto fazia sinal a todos para permanecerem em silêncio.
- Mas o que Skaild veio fazer realmente aqui neste maldito lugar? – retrucou Hevelin, observando tudo ao redor com certo ar de repugnância.
- Essa é uma boa pergunta que ele deveria nos responder. – observou Lehvinia, enquanto olhava para os lados.
- Mehldrik, você faz idéia de onde nós estamos? – Vohldrik puxou o irmão pelo braço. – Nós estamos dentro das terras do Clã dos Mortos-Vivos! Acho melhor sairmos daqui e continuar seguindo a trilha de Skaild.
- Acho que é um pouco tarde para a gente fazer isso, Vohldrik. – disse Mehldrik, enquanto ouvia os gemidos cada vez mais próximos.
O guardião mal terminou de dizer sua frase, e percebeu que vários zumbis estavam saindo das sombras e começando a cercá-los por todos os lados. Eram muitos, inúmeros, arrastando ao redor e indo ao encontro deles. Estendiam os braços de maneira pavorosa e gemiam sem parar. Alguns tinham membros amputados, fossem partes dos braços, das pernas, mas todos tinham extensas feridas expostas em carne viva em suas peles.
- Acho melhor a gente se preparar para nos defendermos. – Mehldrik tinha a voz tensa. – Não temos outra alternativa.
Vohldrik empunhou sua enorme montante, enquanto Hevelin cruzava suas katanas diante de si. Lehvinia colocou suas orbes e ministrou em si mesma rapidamente uma aura astral de defesa. Mehldrik invocou seu escudo astral, ao mesmo tempo em que empunhava sua katana. Estavam todos preparados para entrar em combate com aquela horda de zumbis que avançavam sedentos de carne e sangue, quando subitamente um disparo sombrio atravessou o ar, como uma flecha pontiaguda, acertando em cheio um dos zumbis. Alguém havia acabado de disparar uma flecha das sombras contra a infeliz criatura, que caiu no chão em agonia pura, envolvida por dezenas de flechas espirituais escuras, consumindo-a por completo até virar pó.

quarta-feira, 11 de março de 2009

Capitulo X

Os lobos zumbis se aproximavam cada vez, numerosos, ferozes. Tinham um aspecto tenebroso, com seus pêlos em tons azuis escurecidos, seus olhos prateados e suas presas afiadas, prontas para dilacerar suas vítimas. Mehldrik sabia que não podia perder mais tempo, e nem dizer mais nada. Precisava agir logo, antes que os bandidos da Guilda também os alcançassem na entrada da mina. Olhou para o alto e viu, logo acima da entrada por onde haviam saído, a imponência da montanha de neve que se elevava até sumir por entre as nuvens daquele tempo fechado e nebuloso. O que estava prestes a fazer seria muito arriscado para eles, mas era uma alternativa que poderia tirá-los de duas situações de perigo iminente de uma vez só. Mehldrik virou-se para a entrada da mina.
- Prestem atenção. Quando eu der o aviso, corram o máximo que puderem em direção da cabana.
- O que você pretende fazer? – perguntou Hevelin.
- Tirar a gente daqui da maneira mais rápida possível. Fiquem atentos. – Mehldrik segurou no ombro de Skaild e olhou fixo nos olhos dele – Se não der certo o que estou querendo fazer, e você for o único a sobreviver aqui, volte o mais rápido que puder para o Condado Principal, entendeu?
- Claro, eu entendi. Não se preocupe. – respondeu Skaild.
Enquanto se preparava, Mehldrik começou a enxergar os bandidos movimentando-se pelo corredor da mina, vindo em sua direção. Então ele não perdeu mais tempo, mirou seu escudo astral para a montanha sobre a entrada da caverna e soltou em sequência projéteis de fogo e de pedra.
Imediatamente ouviu-se um estrondo, para em seguida a terra começar a estremecer.
- Corram! Corram! – gritou Mehldrik para Skaild e Hevelin.
O guardião arcano soltou mais dois projéteis de fogo e pedra. Então ele viu uma enorme avalanche de neve vindo em sua direção. Só depois de ter certeza de que havia obtido sucesso em criar a avalanche, Mehldrik começou a correr o mais rápido que podia em direção da cabana, onde Skaild e Hevelin haviam corrido também para se proteger. O barulho da avalanche assustou os lobos zumbis, que rapidamente fugiram do local. Os bandidos ainda estavam correndo pelo interior da caverna e quase alcançando a saída quando ouviram o estrondo e sentiram o tremor, porém não conseguiram sair da mina a tempo, pois a imensa camada de neve que vinha descendo pela montanha havia soterrado todo o local. A cabana, que ficava numa encosta à esquerda próxima à mina também foi atingida, sendo completamente arrastada por grossas camadas de neve montanha abaixo. Mehldrik, Hevelin e Skaild, que haviam entrado na cabana, percebendo o risco que corriam em permanecer ali, se atiraram pelas janelas e correram desfiladeiro abaixo, buscando a todo custo fugir da avalanche que descia arrastando tudo que encontrava pelo caminho. Naquela fuga desesperada, nem Mehldrik e nem Hevelin notaram que Skaild havia se afastado demais deles, correndo praticamente em outra direção, não demorando a desaparecer completamente por entre as árvores da encosta da montanha. O Guardião e a Duelista depararam-se com um desfiladeiro logo à frente a alguns metros adiante e consideraram a possibilidade de realmente não conseguirem pular para o outro lado, onde ficariam a salvo da avalanche. Pularam sobre uma rocha e abrigaram-se numa reentrância abaixo dela, numa minúscula caverna. A avalanche avançou sobre eles, soterrando tudo ao redor. Escuridão e silêncio os envolveram durante longos e angustiantes minutos.
Não muito distante dali, Vohldrik e Lehvinia, que algumas horas antes haviam atravessado o Portal e alcançado as terras geladas das Montanhas de Vahour, superavam com certa dificuldade toda aquela neve, além dos ventos gelados e da nevasca constante. Estavam caminhando pela encosta de uma montanha quando ouviram um estrondo próximo e sentiram um leve tremor. Ficaram apreensivos, sem saber o que poderia ter sido aquele som vindo de algum lugar não muito distante. Foram alguns segundos de certa tensão, até que Lehvinia olhou para sua direita e viu, numa outra montanha próxima, alguém correndo desesperadamente ao longe, descendo que nem um louco montanha abaixo. Alguns metros acima, uma imensa avalanche o perseguia, como que querendo alcançá-lo a tempo de engoli-lo.
- Vohldrik, olhe, lá embaixo! – gritou Lehvinia.
O jovem Guerreiro olhou exatamente para onde a Maga havia apontado, e conseguiu enxergar uma pessoa fugindo desesperada de uma avalanche, tentando, a qualquer custo, chegar ao pé da montanha, antes que toda aquela neve a enterrasse por completo.
- Acho que ele não vai conseguir se salvar. – disse Vohldrik, enquanto observava sem poder fazer nada naquele momento.
O tremor era cada vez mais intenso e o barulho quase ensurdecedor. A avalanche passou diante deles soterrando toda a encosta da montanha vizinha, e alcançando também a pessoa em fuga, que desapareceu sob toda aquela neve na encosta. Depois que todo o perigo havia passado, Vohldrik e Lehvinia desceram rápido até o ponto crítico daquele desastre. Lehvinia usou sua habilidade de teleporte e adiantou-se pelo caminho, chegando em poucos momentos ao local onde a pessoa havia sido soterrada. Vohldrik vinha logo atrás, deslizando agilmente em intervalos rápidos, e assim que alcançou o ponto onde Lehvinia estava, começou a ajudá-la na escavação de salvamento. Conseguiram retirar a pessoa do meio de toda aquela neve. Estava desacordado e com ferimentos no rosto e no braço.
- Vohldrik, me ajude a carregá-lo para aquelas árvores. Preciso ministrar nele uma cura regenerativa para que ele recupere suas forças mais rapidamente. – disse Lehvinia.
Carregaram o homem ferido amparando-o pelos ombros até um local seguro, fora da área de risco, para que não fossem pegos de surpresa por qualquer novo desmoronamento. Repousaram o homem ferido próximo de um pinheiro, e então Lehvinia concentrou-se, energizando seu poder de cura. Em intervalos regulares de dez segundos, ela conduzia sua mão levemente em um movimento semicircular sobre o corpo do enfermo, que era envolvido por pequenas auréolas azuladas cintilantes, que pulsavam suaves até desaparecerem. Repetiu esse processo cinco vezes, até que percebeu os sangramentos leves retraírem-se e os locais feridos regenerando-se lentamente. A pessoa, agora recuperada em suas energias, começava a acordar, abrindo os olhos lentamente.
- O que aconteceu? – perguntou ainda meio aturdido.
- Você foi soterrado por uma avalanche e nós o resgatamos. – disse Vohldrik, agachado ao lado dele.
- Mas não se preocupe. Ministrei uma cura regenerativa em você, apenas descanse um pouco, você ainda precisa recuperar suas forças vitais.
- Eu preciso ir para o Condado Principal...
- Quem é você? – perguntou Lehvinia.
- Eu me chamo Skaild... Fui resgatado por um guardião e uma duelista... Estávamos fugindo da Guilda dos Ladrões... O guardião provocou a avalanche para evitar que fôssemos capturados por eles...
Ao ouvir a respeito do guardião arcano, Vohldrik sentiu seu coração gelar. Apesar de conhecer muitos guardiões arcanos naquela extensa região congelada do continente, teve receio de que talvez pudesse ter sido seu irmão que estivesse tentando resgatar Skaild. Ficou um pouco apreensivo e receoso em perguntar a respeito do guardião, temendo uma resposta que não lhe agradasse.
- Skaild, você sabe o nome do guardião que resgatou você?
- Ele não chegou a me dizer... Ele disse o nome da duelista algumas vezes... Ela se chamava Hevelin...
- Vohldrik, você acha que o guardião pode ser seu irmão? – questionou Lehvinia depois de perceber uma expressão meio preocupada e pensativa no semblante do jovem Guerreiro.
- Não tenho certeza. Eu espero que realmente não seja ele.
Skaild, com certa dificuldade ainda e voz quase sussurrante, explicava tudo o que havia ocorrido momentos antes de ser tragado pelo desmoronamento. Através de frases soltas, ia contando sobre como foi capturado e mantido refém pela Guilda dos Ladrões por ordem de Kashu, e como foi resgatado de dentro da mina onde estava preso.
- Lehvinia, isso significa que estamos próximos de encontrar o local onde Kashu está escondido junto com a Guilda.
Skaild, sentindo sua força vital se restabelecer aos poucos, apoiou-se nos braços e recostou-se no tronco do pinheiro.
- Onde estão o guardião e a duelista que resgataram você? – indagou Lehvinia.
- Não sei dizer, mas acredito que foram soterrados mais acima na montanha. A gente estava descendo juntos, mas quando eu percebi, já tínhamos nos separado. Eu me perdi deles.
Lehvinia, que ainda permanecia ajoelhada próxima de Skaild, levantou-se e olhou decidida para Vohldrik.
- Precisamos subir a montanha e encontrar as pessoas que resgataram Skaild. Eles ainda devem estar vivos, e podem nos ajudar na busca por Kashu. Ele pode estar dentro daquela mina soterrada. Precisamos nos certificar disso para podermos voltar e informar ao Capitão Mark.
Vohldrik concordou, apesar de temer que aquele guardião soterrado naquela montanha pudesse ser seu irmão. Então os dois, percebendo que Skaild não tinha condições de acompanhá-los na subida da montanha, concordaram pelo seu retorno imediato para o Condado Principal de Tundra Infame. Skaild também estava decidido a voltar para a cidade o quanto antes, pois temia agora, mais ainda, pela sua vida, e não queria de maneira nenhuma cair novamente nas mãos dos ladrões. Lehvinia ministrou por mais um minuto nova cura regenerativa em Skaild, para que ele se recuperasse efetivamente e pudesse seguir jornada de volta ao Condado Principal. Antes de ir, Skaild explicou vagamente para os dois onde achava que havia se separado do guardião e da duelista. Em seguida, despediram-se. Vohldrik e Lehvinia prepararam-se para subir pela montanha em busca dos guerreiros desaparecidos.

domingo, 8 de março de 2009

Capitulo IX

Mehldrik deu o sinal para Hevelin, e ambos começaram a correr para lados opostos, cada um com um objetivo diferente naquele momento. O Guardião Arcano concentrou-se enquanto corria, e escolheu seu primeiro alvo, um dos membros da Guilda que estava mais próximo dele. Então lançou seu escudo de maneira feroz e certeira, atingindo o ladrão em cheio, fazendo-o cair inerte e morto ao chão. Assim que o escudo voltou para suas mãos, Mehldrik parou e soltou projéteis de fogo contra dois ladrões que vinham de sua esquerda. Outros três aproximaram-se aproveitando o momento, e Mehldrik percebeu que não daria tempo para soltar projéteis nos oponentes que vinham em sua direção de espadas em punho. Então se virou rapidamente e soltou um golpe circular com a katana para derrubar todos ao mesmo tempo. Então aproveitou a oportunidade e soltou projéteis relâmpagos nos ladrões caídos, que não tiveram qualquer chance de reação. Melhdrik havia eliminado todos os membros da Guilda que estavam na entrada da mina. Já Hevelin entrou na cabana com determinação, pegando os ladrões ali de surpresa. Eram apenas quatro deles, e somente um teve tempo de empunhar sua daikatana contra a duelista. Ela usou o golpe da espiral fantasma para atingir os ladrões que estavam desarmados, e mal teve tempo para se proteger contra o ataque da daikatana do oponente armado. Agilmente usou seu próprio pé para arrastar o pé do ladrão, fazendo o mesmo desequilibrar para trás. Hevelin, então, aproveitou o momento e com movimentos rápidos largou o golpe do Corte da Lua Gêmea contra o infeliz, que já caiu sem vida no chão da cabana. Um pouco ofegante, Hevelin deu uma rápida olhada ao redor, como se procurasse por pistas, e percebendo que nada de importante havia naquela cabana a não ser o clima quente proporcionado pela lareira acesa, saiu dali rapidamente, indo ao encontro de Mehldrik na entrada da mina.
- Havia apenas quatro na cabana – explicou Hevelin. – Isso significa que teremos muito mais problemas lá dentro.
- A gente precisa ser rápido e fazer ataques direcionados e centralizados. Não sabemos realmente quantos ladrões existem dentro da mina. – disse Mehldrik, preocupado com a situação.
- Então é melhor não perder mais tempo e entrar.
Os dois correram na direção da entrada da mina, e iniciaram uma invasão sorrateira. O local era mal iluminado, quase escuro, e havia caixas e sacos empilhados em toda parte, em diversos pontos daquele corredor de pedra. Enquanto penetravam naquele antro perigoso, Hevelin concentrou ainda mais sua técnica da lâmina intensa, pois tinha certeza de que o combate ali dentro não seria realmente fácil. Mehldrik, dessa vez, acompanhou a atitude de Hevelin, e concentrou-se para enrijecer seu escudo, de forma a aumentar os danos causados pelo mesmo contra os inimigos. Continuaram a caminhar cada vez mais para dentro da mina, acompanhando a sinuosidade do percurso quase escuro, até que enxergaram luminosidade mais intensa em determinado ponto. Chegaram a uma caverna iluminada por lampiões cristalizados presos nas paredes de pedra. Ali no local, podiam ver uma pilha imensa de caixas de todos os tamanhos, e sacos empilhados em diversos cantos do lugar. Havia mais ladrões ali distraídos, conversando e rindo. Mehldrik, escondido atrás de algumas caixas, passou rapidamente os olhos e contou seis pessoas naquele lugar. Ele fez sinal para Hevelin manter-se em seu lugar, e então se levantou rapidamente, correndo em direção aos ladrões. Mehldrik queria se livrar o quanto antes daqueles oponentes, então preferiu apenas usar sua katana, dando novo golpe circular para derrubar todos que estavam à sua frente. Pensou rápido, olhou a imensa pilha de caixas ao seu lado, e assim como fizera nas montanhas quando encontrou o primeiro bando, se lançou em saltos laterais pelas caixas, de forma a dar impulso para o seu golpe da guilhotina. Rodopiou rapidamente pelo ar e deixou sua katana agir sobre os inimigos implacavelmente. Dessa vez, a força de seu golpe não apenas matou os inimigos, como acabou rachando parte do chão ao seu redor. Em questão de segundos, havia derrubado e eliminados todos ali. Hevelin, que apenas observava escondida, saiu em direção a Mehldrik.
- Henkoff realmente estava certo em suas suspeitas. Todas as mercadorias roubadas estão aqui. – disse Hevelin.
- Isso aqui parece somente uma pequena parte dos roubos. Deve haver muito mais lá para dentro da mina. Temos que encontrar Skaild logo, se é que ele está aqui mesmo.
- Se ele estiver, e os ladrões souberem de nossa invasão, presumo que tenhamos que ser rápidos em achar ele, caso contrário ele acabará sendo eliminado.
A partir daquele ponto da caverna havia bifurcações no caminho. Eram três novas entradas que seguiam caminhos diferentes para dentro da mina. Mehldrik e Hevelin sabiam que agora, se quisessem realmente agir rápido e tentar encontrar Skaild, teriam que se dividir. A decisão era perigosa para eles, mas era a única maneira de vasculharem toda aquela mina em um espaço de tempo menor e terem mais chances de encontrarem logo Skaild. Decidiram pelas entradas das extremidades, esperando realmente terem sorte em suas escolhas. Mehldrik caminhava ágil e sorrateiro, e sem perder tempo, havia descido muitos metros pelo corredor da mina, encontrando um vão iluminado por dois lampiões cristalizados. Ao fundo havia uma porta larga de madeira impedindo sua passagem. Soltou diversos projéteis de fogo contra a porta, até que a mesma se despedaçou completamente, revelando uma caverna maior do que a primeira, com mais caixas empilhadas por todos os lados, sendo a maioria coberta por lonas de couro. Como dessa vez não havia mais o fator surpresa, Mehldrik foi recepcionado por ladrões já esperando pela sua entrada, todos empunhando katanas, daikatanas e montantes, prontos para o atacarem. Mehldrik então teve uma idéia para reverter a situação em seu favor. Percebeu que o local era iluminado por 5 lampiões cristalizados, um em cada canto da caverna e o último ao centro, encravado no chão como uma espécie de abajur. Logo após entrar, olhou à sua esquerda e lançou seu escudo astral contra o lampião na parede. Pulou sobre algumas caixas à sua direita, esperou seu escudo retornar e lançou ele novamente, desta vez contra o lampião no canto direito da parede de pedra. Dessa forma, ele esperava escurecer cada vez mais o local e dificultar os ataques dos bandidos. Correu para os demais cantos da caverna, pulando sobre caixas e sacos, até acertar os outros dois lampiões cristalizados que estavam ainda acesos. O local ficou quase às escuras, e foi nesse momento que Mehldrik decidiu atacar os ladrões, lançando diversos projéteis congelantes e de relâmpago de seu escudo. Um a um, os ladrões foram sendo mortos, até que restou apenas um brutamontes mal encarado envergando uma montante. Ele tentou acertar Mehldrik, que se esquivou dando uma cambalhota para trás e partindo pra cima do gigante, atingindo-o com um choque arcano. A agilidade do golpe e a força da joelhada fatal lançou o enorme ladrão contra a parede de pedra da caverna, fazendo ele afundar completamente na rocha, abrindo um rombo. O ladrão caiu de joelhos para frente, e tombou seu corpo pesado juntamente com dezenas de pedras. Mehldrik olhou ao redor, e começou a ficar preocupado, pois ainda não tinha encontrado nenhum sinal de Skaild em todo o percurso da mina até ali. Olhou para o fundo da caverna e viu mais uma porta de madeira, idêntica a anterior.
- Isso está começando a ficar chato e cansativo. – disse, irritado. – Eu espero que Hevelin tenha mais sorte do que eu, e já tenha achado Skaild.
Enquanto o jovem Guardião Arcano abria caminho e derrubava todos os oponentes que encontrava, Hevelin descia por uma gruta mal iluminada e sinuosa. Assim como Melhdrik, também ela encontrou uma porta larga de madeira. Com alguns golpes de suas katanas, ela pôs abaixo a porta, entrando em mais uma caverna. Os ladrões que ali estavam partiram para cima dela. A duelista não perdeu tempo e saiu girando em esquivas, livrando-se dos golpes, ao mesmo tempo em que imprimia agilmente as lâminas de suas katanas contra os bandidos, soltando três seqüências cruzadas com luminosidades intensas e eliminando todos de seu caminho. Dessa vez, sua rapidez foi tamanha, que suas katanas começaram a criar fechos de luz em cada golpe que soltava. Hevelin respirou fundo e olhou um pouco aturdida para suas espadas. Sentiu como se a Força Arcana dentro de si começasse a se potencializar cada vez mais em poder e força. Olhou ao seu redor, e percebeu que ali havia somente caixas e mais caixas com mercadorias roubadas, e que aquela caverna era o ponto final, a última galeria daquele caminho que escolhera momentos antes na bifurcação que havia encontrado junto com Mehldrik. Skaild também não estava ali. Teria que voltar para a caverna onde haviam se separado.
Na outra parte da mina, Mehldrik já havia passado por cinco cavernas e eliminado quase 40 ladrões. Estava sentindo já certo cansaço por todos aqueles combates. Então enxergou mais uma porta à sua frente e esbravejou para sim mesmo:
- Maldição! Isso não acaba nunca?
Partiu com raiva extrema em direção à porta, soltando dessa vez fortes projéteis de pedra com o obstáculo à sua frente. Mehldrik sabia quando ficava realmente revoltado e irritado com uma situação de combate. Era exatamente quando ele começava a soltar poderosos projéteis de pedra, como estava fazendo naquele exato momento. Precisou apenas de duas rajadas de projéteis para colocar a porta abaixo. Estava se preparando para novo confronto, quando estranhamente entrou naquela caverna cheia de caixas, e não encontrou nenhum bando de ladrões. Examinou o local, e então viu no fundo da caverna, em meio a pilhas de caixas, uma pessoa agachada no chão. Estava com as mãos e pernas amarradas por cordas. “Só pode ser Skaild”, pensou Mehldrik consigo mesmo. Caminhou na direção onde a pessoa se encontrava e parou bem em sua frente.
- Skaild? – perguntou Mehldrik, esperando uma resposta afirmativa.
- Por que esse espanto? Vocês me mantêm preso aqui nesse lugar e agora esquecem quem está preso?
- Você é Skaild? – insistiu Mehldrik.
- Espere um momento... Olhando agora com mais atenção, você não parece ser uns dos ladrões do grupo de Kashu. Você veio me resgatar?
- Sim, eu vim a pedido do meu amigo Simon, do Condado principal da Tundra Infame. Vim resgatar você para levá-lo de volta ao condado em segurança.
- Então você é a pessoa que Simon enviou para me salvar? – perguntou Skaild, abrindo um sorriso no rosto.
- Isso mesmo. – respondeu Mehldrik, enquanto desamarrava Skaild. – Agora que encontrei você, precisamos sair daqui o mais rápido possível.
- Finalmente! Simon conseguiu encontrar alguém disposto a me salvar! – Skaild mostrava-se agora mais sorridente e eufórico. Seu rosto, que antes mostrava uma expressão ensimesmada e preocupada, mudou completamente, deixando transparecer uma fisionomia mais alegre. – Eu tinha certeza de que ele encontraria uma pessoa capaz de me resgatar!
- Não temos tempo para conversar agora. Você tem que sair daqui em segurança. – Disse Mehldrik, enquanto voltava e observava o caminho de onde viera, para ter certeza de que não havia mais nenhum bandido da Guilda. Estava meio tenso, pois sabia que agora teria que encontrar Hevelin e sair daquela mina antes que mais bandidos aparecessem pelo caminho e tornassem a fuga deles mais difícil ainda. Orientou Skaild para que o seguisse de perto, mantendo-se atrás dele sempre. Fazia agora todo o caminho inverso, passando pelos corredores e cavernas onde havia travado vários combates com os ladrões.
- Não tenho como lhe recompensar pelo que você está fazendo comigo agora, mas não se preocupe! Eu irei lhe recompensar adequadamente com certeza! – dizia Skaild, que não parava de sorrir.
- O que importa para mim agora é levar você de volta ao Condado em segurança, pois eu sei que você tem informações muito importantes a respeito dos desaparecimentos que vêm ocorrendo há tempos por toda Nevareth.
- Sim, de fato, eu tenho informações importantes sobre os desaparecimentos, e isso deve ter sido um motivo a mais para que Kashu e seu bando quisessem me eliminar de alguma forma. - explicou Skaild, enquanto corriam pelas galerias da mina. – Eles iriam me vender para o Exército Mercenário, pois somente assim eu quitaria minha dívida com eles e nunca mais seria encontrado por ninguém.
Mehldrik subitamente parou, o que fez com que Skaild que vinha logo atrás se esbarrasse nele. O Guardião Arcano sentiu que o momento poderia ser único e que ele poderia obter respostas rápidas a respeito dos desaparecimentos com Skaild ali, naquele momento. Virou-se para Skaild e o encarou com uma fisionomia tensa.
- Skaild, eu sei que você sabe de muita coisa que pode elucidar de vez todo esse mistério sobre os desaparecimentos, por isso eu quero deixar claro a você desde já que estou salvando você tão somente para que você possa esclarecer a todos de Nevareth sobre isso. – Mehldrik fez uma pausa, como que pensando em suas próximas palavras – Também eu preciso de respostas sobre esse mistério, e eu sei que somente você poderá me esclarecer muita coisa.
Skaild sentiu um certo calafrio percorrendo sua espinha, e mesmo sorriso meio sem graça, sentiu-se intimidado tanto pelo olhar de Mehldrik quanto pelo que ele acabava de dizer.
- Não se preocupe. Tudo o que sei eu irei revelar a todos. Sei o quanto isso é importante para todos. – Skaild continuava sorrindo, apesar de estar agora um pouco nervoso. – Agora precisamos sair daqui, como você mesmo disse, não é mesmo?
Mehldrik permaneceu impassível por alguns segundos, até que caiu em si e percebeu que Skaild tinha razão no que havia dito. Tinham que deixar qualquer explicação para depois, e precisavam se concentrar em sair daquela mina antes que mais bandidos da Guilda dos Ladrões aparecessem por ali e atrapalhassem sua fuga.
- Mantenha-se atrás de mim, como eu disse. – falou o Guardião secamente.
Continuaram a correr pelos corredores, e Mehldrik reconheceu a caverna à sua frente onde tinha se separado de Hevelin. Ao entrar naquela galeria, conseguiu encontrar a duelista a tempo de impedir ela de tomar o caminho do meio na bifurcação.
- Hevelin, encontrei Skaild. Agora precisamos correr e sair logo daqui.
- Espere! – disse Hevelin, repentinamente – Você está ouvindo isso?
Os três ficaram em silêncio por alguns momentos, e começaram a ouvir murmúrios distantes e confusos vindos justamente do caminho do meio na bifurcação, o único que eles não haviam entrado. Aqueles sons pareciam se aproximar cada vez mais, e então aqueles murmúrios se transformaram em gritos de ordem ecoando naquele corredor. Tudo levava a crer que mais ladrões estavam no interior daquela mina, e estavam se aproximando para saber o que estava havendo por ali.
- Mais ladrões! – disse Mehldrik com uma voz tensa. – Precisamos sair daqui agora!
- Vamos, o caminho por onde viemos é por ali. – disse Hevelin, apontando para a saída oposta da caverna.
- Skaild, continue atrás de mim, e não olhe para trás. Hevelin, cubra a nossa retaguarda.
Saíram em disparada pelos corredores e cavernas, e enquanto corriam, podiam ouvir os gritos dos ladrões cada vez mais perto, esbravejando sem parar. “Invadiram o esconderijo! Procurem os invasores! Eles não devem estar longe!”, exclamavam os bandidos pelas galerias da mina. Mehldrik e Hevelin sabiam perfeitamente que entrar com combate naquele momento colocaria em risco a vida de Skaild, então a fuga desesperada era a única saída daquela situação. Ambos haviam cumprido exatamente com as missões que lhe foram confiadas, e por isso mesmo, nada mais tinham a fazer ali agora. De uma só vez, acharam o esconderijo onde estavam as mercadorias roubadas pela Guilda e encontraram Skaild, mantido como refém. Agora, para completarem de vez suas missões, precisavam retornar imediatamente para o Condado principal de Tundra Infame. Minutos intermináveis separavam Mehldrik, Helevin e Skaild da saída da mina. Enfim, avistaram a saída do túnel, e continuaram correndo ao encontro da claridade que se tornava mais intensa adiante.
Quando finalmente saíram da mina, sentiram alívio e sabiam que a partir dali, a fuga seria mais fácil e rápida. Entretanto, o sentimento de alívio e liberdade não iria durar muito. Abruptamente, os três pararam bem diante da entrada da caverna. A nevasca não parava de cair, mas agora não estava tão intensa, o que facilitava enxergar o novo perigo que surgiu diante deles. Entre os corpos dos ladrões que permaneciam caídos por ali, rondavam uma matilha de lobos zumbis, rosnando ferozes e andando em círculos de maneira perigosa. Logo perceberam a presença de Melhdrik, Hevelin e Skaild, voltando-se contra eles de maneira sorrateiramente agressiva. Permaneceram imóveis, em posição de combate, exceto Skaild, que se esquivava atrás de Mehldrik, tentando se proteger. Atrás deles, os ladrões se aproximavam rapidamente, quase alcançando a saída da mina.
- E agora? – perguntou Hevelin, um pouco nervosa, enquanto empunhava suas katanas.
- São muitos lobos. Vamos perder tempo combatendo toda essa matilha. – disse Mehldrik, olhando ao redor, enquanto pensava numa forma de saírem daquela situação.
- Não temos mais tempo! – exclamou Skaild enquanto olhava para a entrada da caverna com um olhar assustado. – Os ladrões estão se aproximando!
Mehldrik olhou também para trás, encarando a entrada da mina. Foi quando ele teve uma idéia de como se livrar dos bandidos e dos lobos zumbis ao mesmo tempo.
- Já sei como iremos sair daqui.

sexta-feira, 6 de março de 2009

Capitulo VIII

Na manhã seguinte, Vohldrik e Lehvinia deixaram a morada do Capitão Mark, e iniciaram sua jornada pelas areias escaldantes do imenso Deserto da Lamentação. Estavam ainda pensando na missão extremamente importante que tinham agora, e algumas vezes seus pensamentos com relação a essa nova jornada traziam sensações de surpresa ainda. Nunca imaginariam eles dois que sairiam da residência do Capitão com um objetivo tão importante a ser cumprido, e muito menos que teriam tamanha responsabilidade baseada na confiança depositada neles pelo Capitão. Durante a jornada, Vohldrik contou para Lehvinia a respeito de sua família desaparecida, seu irmão guardião e sobre como viviam em Tundra Infame, sendo criados pelo padrinho deles, o Oficial Henkoff. Porém, caminharam a maior parte do trajeto em silêncio, mais para pouparem suas forças sob aquele sol causticante do que por falta de assunto qualquer. Tentavam se proteger daquele calor quase insuportável que reinava naquelas planícies desertas. E para que a viagem nunca fosse muito cansativa, tanto Vohldrik quanto Lehvinia carregavam somente o essencial para a jornada, e suas vestimentas eram as mais leves possíveis. Vohldrik, com sua armadura leve sob a capa de couro de cobras gigantes, e Lehvinia em seu quimono de seda, uma vestimenta que deixava à mostra parte de suas pernas e seus braços, ambos já bastante bronzeados pelo sol do deserto.
Caminharam por dois dias e duas noites, com paradas programadas para descanso. Na manhã do terceiro dia avistaram ao longe o condado principal do Deserto da Lamentação. O calor abrasivo deformava a linha do horizonte, e de cima de um monte, Vohldrik e Lehvinia podiam ver a cidade. Estavam seguindo as orientações do Capitão Mark a respeito da localização exata do Portal, e por isso não foram em direção ao condado. O Portal ficava nas imediações da cidade, a cerca de cinco quilômetros na direção sudeste, em um local de difícil acesso.
Na realidade, a dificuldade de acesso era apenas um artifício utilizado para evitar possíveis visitas de viajantes e moradores da região, já que em toda a extensão do Deserto da Lamentação havia centenas de edificações em ruínas, construções abandonadas que na maioria das vezes serviam de abrigo aos inúmeros viajantes que sempre se aventuravam a tentar atravessar as areias do deserto. Em função disso, a localização exata onde o Portal havia sido construído era bem peculiar. Ele ficava escondido no fundo de pequeno vale cheio de corredores estreitos e sombrios, e possivelmente esse clima soturno também acabava afastando os possíveis curiosos que resolvessem perambular pela localidade. Além disso, o próprio Portal tinha um sistema de funcionamento que agia como um mecanismo de proteção, onde somente aqueles que traziam o cartão de teletransporte é que poderiam atravessá-lo sem problema. Para aqueles que não dispunham de um cartão, a entrada dimensional não era acessível e não poderia ser vista. Nada seria visto, a não ser um imenso portal em arco encravado na rocha e construído com pedras talhadas e bem trabalhadas, tendo na parte superior do arco a imagem de um imenso rosto com uma expressão intimidatória, em cuja parte superior de sua cabeça havia um rosto menor, além de um semi-arco com 7 pequenas espadas encravadas. Nas paredes interiores da entrada podiam ser vistos entalhados diversos hieróglifos da língua regional. Esses mesmos sinais podiam ser vistos nas pequenas rochas lapidadas que ficavam dispostas em destaque na parte superior do Portal, logo atrás da imensa cabeça.
Vohldrik e Lehvinia avistaram ao longe uma matilha de raposas do deserto, enquanto seguiam pelo caminho que os levariam ao pequeno vale. Desceram, então, pelos corredores esguios e penumbrosos, e seguindo as orientações do Capitão Mark, conseguiram encontrar o Portal.
- Enfim, chegamos. – disse Lehvinia, enquanto observava o lugar atentamente.
- Que local difícil de ser encontrado esse aqui. – disse Vohldrik olhando para o Portal – Se não fosse pelas orientações detalhadas do Capitão, a gente não encontraria esse lugar no meio desse labirinto de pedra.
Lehvinia chegou um pouco mais perto, e fez um ar de desconfiada.
- Vohldrik, estranho dizer isso, mas eu acho que o Portal não está funcionando. Só vejo ali uma parede de pedra.
Vohldrik ficou um pouco confuso, e começou a considerar a possibilidade do Capitão Mark ter se enganado com relação ao local da passagem.
- Não é possível. O Capitão explicou detalhadamente para a gente, e explicou duas vezes, para que tivéssemos certeza do local exato. – Vohldrik abriu sua pequena bolsa de couro, procurando o cartão de teletransporte em seu interior. – Será que o Capitão nos deu os cartões corretos?
Assim que Vohldrik pegou o cartão, ele olhou novamente para o Portal, e começou a observar uma breve cintilação luminosa sair de dentro dele. O brilho luminoso foi aumentando levemente, até se converter numa espécie de aura envolvendo a entrada do lugar.
- Lehvinia, pegue o seu cartão. Eu já entendi como o Portal funciona.
- Entendeu? Então o Portal funciona mesmo? – perguntou a maga, toda curiosa.
- Sim, funciona. Exatamente como o Capitão nos disse. Só que você precisa estar com o cartão em mãos. Pegue o cartão e veja você mesma.
Lehvinia pegou o cartão que havia guardado consigo, segurou e encarou o Portal. Ao perceber também a aura se formando diante de si, começou a rir eufórica, abraçando Vohldrik, que ficou meio sem jeito com aquela atitude amistosa repentina.
- Isso é fascinante! Realmente funciona, impressionante! – dizia Lehvinia, entre sorrisos.
- Eu só espero que consigamos encontrar o caminho correto até Midreth. – comentou Vohldrik, pensativo. – Preparada para atravessar?
- Sim, estou, lógico! – respondeu Lehvinia, entusiasmada.
Vohldrik então atravessou primeiro, seguido de perto por Lehvinia. Não demorou muito e estavam os dois em um imenso saguão circular com paredes e pisos em tons de um azul escurecido, que era devidamente iluminado pelas auras brilhantes que emanavam de cada uma das diversas portas que rodeavam completamente o lugar. Vohldrik olhou para o chão, e percebeu que aquele todo aquele lugar, o piso, o teto, e inclusive as paredes, eram revestidos de metal, com rebites em diversos pontos a reforçar sua estrutura. Lehvinia olhava maravilhada, e ao mesmo tempo surpresa, todo aquele ambiente, pois nunca tinha visto antes um lugar igual àquele. Caminharam em direção ao centro do saguão.
- Vohldrik, acho que não teremos dificuldade em encontrar nosso destino. – disse Lehvinia.
- Realmente, você tem razão.
De fato, eles não teriam dificuldade nenhuma em encontrar a porta certa que os levaria até Midreth. Na frente de cada uma das portas havia uma espécie de holograma de um brasão flutuando de maneira giratória. Cada brasão indicava um lugar importante de Nevareth, representando uma cidade, uma região ou um dos continentes conhecidos. Entretanto, nem todas as portas pareciam estar funcionando.
- E aquelas portas? Elas parecem desativadas. – questionou Lehvinia.
- Estranho isso. Mesmo estando com o cartão, elas não se ativam. – disse Vohldrik, olhando para o seu cartão e para as portas inativas.
- Será que elas funcionam somente com outros cartões diferentes de teletransporte?
- Provavelmente. Sobre isso, o Capitão não comentou nada com a gente.
- Qual será o destino dessas portas? Fiquei curiosa agora – comentou Lehvinia, aproximando-se das portas.
- Lehvinia, acho que se o Capitão não nos disse nada, é porque não nos diz respeito no momento. Como ele mesmo nos explicou, algumas coisas que ele sabe não é permitido contar.
- Não é permitido ainda, pelo que eu entendi nas explicações meio misteriosas dele.
- Bom, acho melhor nos prepararmos para atravessar o portal que nos levará ao continente de Midreth.
Dito isso, Vohldrik e Lehvinia caminharam em direção ao Portal cujo holograma giratório mostrava o brasão do Continente de Midreth. Como sabiam que estavam prestes a adentrar num ambiente completamente dominado pelo gelo e por temperaturas congelantes, trataram de se agasalhar da forma como podiam. O jovem guerreiro ajeitou-se em sua capa que estava usando, e cobriu a cabeça com o capuz, enquanto Lehvinia tirava de seu pequeno alforje uma capa e a vestia para protegê-la do frio das montanhas. Quando acharam que estavam devidamente preparados para atravessar o Portal, entreolharam-se de maneira firme, respiraram fundo e seguiram em direção à passagem que os levaria para as terras inóspitas e geladas de Midreth.
A alguns quilômetros do Portal por onde Vohldrik e Lehvinia sairiam, Mehldrik e Hevelin caminhavam num ritmo acelerado, buscando transpor com rapidez os caminhos cobertos por centímetros de neve. O tempo sempre instável era um obstáculo constante, e a nevasca diminuía de intensidade, mas nunca parava de cair. Mehldrik estava disposto a não fracassar em sua missão de resgatar Skaild, pois sabia que o sucesso de seu objetivo significava obter as respostas que há tempos ele buscava sobre o desaparecimento de seus pais. Caminharam durantes horas pelas florestas cobertas de neve, desafiando penhascos com seus caminhos estreitos desenhados nas beiras de montanhas, atravessando rios quase congelados por completo em seus cursos e evitando ao máximo encontrarem monstros pelas trilhas que escolhiam. Horas ininterruptas caminhando em direção ao local exato que o Oficial Henkoff suspeitava ser o esconderijo da Guilda dos Ladrões, até que em um determinado momento, Mehldrik parou subitamente, depois de avistar uma movimentação estranha há alguns metros adiante de onde estavam. Rapidamente puxou Hevelin para trás de algumas árvores, e fez gestos sutis, pedindo que a duelista se mantivesse em silencio. A tempestade havia diminuído mais uma vez, porém, a neve que caía ainda atrapalhava a visão de ambos. Ainda assim, eles podiam visualizar vultos próximos de uma entrada do que parecia ser uma mina abandonada. Sorrateiramente, Mehldrik e Hevelin foram se aproximando do local avistado, esgueirando-se por entre árvores e pedras no caminho. Hevelin viu ali próximo do local da entrada uma pequena clareira entre as árvores, e uma cabana.
- É aqui o local descrito por Henkoff. – sussurrou Hevelin no ouvido de Mehldrik. – A entrada de uma mina, uma clareira e uma cabana abandonada.
- Então aqueles que estão na entrada da mina devem ser da Guilda dos Ladrões.
- Eles devem estar vigiando a entrada. Não consigo enxergar direito, mas parece que são seis ou sete que estão na porta.
- Acredito que deva ter mais homens naquela cabana. Eles não ficariam tão dispersos aqui fora se não tivessem alguma equipe de apoio lá dentro para o caso de possíveis invasores aparecerem.
- E dentro da mina? – perguntou Hevelin.
- Primeiro vamos ter que cuidar desses que estão aqui fora. Então, quando entrarmos na mina, teremos que agir rápido, caso Skaild esteja como refém aqui.
- Então não podemos perder mais tempo. Temos que agir logo. Tem alguma sugestão?
- Tenho. Vamos nos separar de novo. Você cuida do pessoal dentro da cabana, enquanto eu cuido daqueles ali fora.
Hevelin, então, empunhou mais uma vez suas duas katanas, enquanto Melhdrik invocava seu escudo astral e empunhava sua katana. Os dois estavam mais do que preparados para agir novamente.

segunda-feira, 2 de março de 2009

Capitulo VII

Enquanto o Capitão Mark terminava de proferir sua frase enigmática para Vohldrik e Lehvinia, com um olhar fixo e quase hipnótico, mais alguém adentrava em seus domínios pessoais, dessa vez de maneira mais comedida, porém em passos firmes e com postura mais determinada. Era um dos soldados da Guarda Oficial do condado principal do Deserto da Lamentação. Adentrava de maneira solene, porém com passos ágeis e respeitosos, vestido com sua farda militar em tons de cinza e verde coberto por uma capa que ainda trazia vestígios das areias do deserto. Tinha um pequeno turbante também cinza enfaixado em sua cabeça, turbante este que protegia o seu quepe e cujo pano descia pelo seu pescoço quase que como uma echarpe, levemente escondida pela gola alta de sua farda. Um pequeno óculos de lentes escuras, que mais se assemelhava a um protetor para sua visão, escondia seus olhos de todos. Já era noite quando aquele soldado havia chegado à residência do Capitão Mark com importantes mensagens.
- Capitão Mark, boa noite. – disse o soldado em tom de respeito, enquanto tirava o pequeno óculos de seu rosto.
- Boa noite, meu jovem soldado. Presumo que você tenha mais notícias para me entregar.
- Sim, Capitão. O Oficial Dunhike me enviou com missão de trazer mais notícias importantes para o senhor. – dizia o soldado, enquanto mantinha uma postura ereta e entregava um pergaminho ao Capitão. – Ele me orientou a informá-lo que se trata de informações urgentes vindas do Continente de Midreth.
Ao ouvir isso, Vohldrik sentiu um aperto gelado no seu coração, que o deixou um pouco assustado quanto ao conteúdo daquelas informações. Lehvinia, ao contrário, apesar de ter percebido o olhar meio assustado de Vohldrik, fazia uma cara de confusa e curiosa ao mesmo tempo, pois ela percebia que muitas informações estavam sendo passada entre as diversas autoridades dos continentes e condados de Nevareth, e com certeza aquele soldado trazia mais notícias a respeito dos desaparecimentos misteriosos.
- Presumo que sejam as notícias que eu já esperava realmente. – disse o Capitão, enquanto desenrolava e lia calmamente o pergaminho entregue pelo soldado mensageiro. – E realmente são.
- Capitão, desculpe a intromissão, mas o que diz neste pergaminho? Eu gostaria de saber, já que são notícias importantes vinda de meu continente. – Vohldrik estava apreensivo e queria muito saber o que se passava em sua terra natal.
- De acordo com o que está escrito aqui, a situação parece ter se complicado em Midreth. A conhecida Guilda de Ladrões está no Continente, causando tumulto e confusões por lá. E aqui também diz que o maior porto comercial do Midreth, o Porto de Hebrat foi fechado por medida de segurança, em vista dos excessivos números de roubos que vem ocorrendo por lá, causando enormes prejuízos a todos os comerciantes de diversas cidades que dependem do porto, entre elas o condado principal de Tundra Infame.
- Faz tempo aqueles baderneiros estão em Midreth, capitão. – disse Vohldrik – Eu mesmo já lutei com alguns membros dessa Guilda, que eventualmente aparecem pelos condados, trazendo caos e saqueando diversos comerciantes. Mas quando eu deixei Midreth, o porto ainda estava aberto a todos.
- Creio que a situação em seu continente, Vohldrik, pelas notícias trazidas agora, está piorando. – opinou Lehvinia.
- Era inevitável que toda essa situação se formasse e desencadeasse tais conseqüências. – interrompeu o Capitão Mark – Meus jovens, desde que a Guilda dos Ladrões migrou para as terras geladas de Midreth, uma série de fatos tem preocupado a todas as autoridades. Não faz muito tempo houve um grande alvoroço desde que uma mulher foi nomeada chefe desde a criação dessa Guilda. Entretanto, pouco tempo depois de sua criação, uma espécie de golpe de estado entre eles foi armado. Disseram que o golpe foi planejado pelo homem que era considerado a segunda pessoa no comando, e acreditava que seria a pessoa indicada para a posição. Seu nome é Kashu.
- Kashu? – espantou-se Vohldrik. Ele já ouvira aquele nome algumas vezes, em algumas conversas com Mehldrik. – Meu irmão já me contou a respeito desse homem. Ele me disse que esse Kashu pode ser o principal responsável pelos roubos que estão ocorrendo por lá.
- Sem dúvida, jovem Vohldrik. – concordou o Capitão. – Sem dúvida nenhuma que o principal responsável seja Kashu. Tanto pelo golpe interno que parece estar sendo arquitetado na Guilda quanto os constantes roubos pelo continente. Todos esses acontecimentos estão sendo organizados por ele. E ao que tudo indica, parece que ele quer desestabilizar economicamente a região, ao mesmo tempo em que aplica um golpe de estado interno na Guilda.
- Capitão Mark, o Oficial Dunhike também solicitou remeter de volta suas considerações acerca das notícias pelo senhor recebidas. Ele aguarda pelas suas respostas. – disse o soldado, que ainda permanecia de pé, impassível, atento a tudo o que era dito no momento.
- Não se preocupe, soldado. Formularei minhas considerações para que você as entregue em mãos ao Oficial. Como já anoiteceu, recomendo que você passe a noite aqui, e assim que amanhecer, você pode retornar ao Condado com meus relatos. Por enquanto, pode se retirar e descansar para amanhã seguir viagem de volta.
Dito isso, o soldado consentiu com a sugestão do Capitão e pediu licença a todos os presentes, saindo logo em seguida. Assim que ficaram mais uma vez sozinhos, o Capitão Mark virou-se para Vohldrik e Lehvinia, fazendo uma breve pausa antes de começar a falar, o que causou certo clima de suspense no ar. Tudo indicava que ele tinha algo muito importante para dizer naquele momento.
- Meus jovens, hoje vocês demonstraram determinação e coragem quando abraçaram a missão de chegarem até aqui. Cada um de vocês com suas missões e objetivos, mostraram força, persistência e vontade de alcançar o ponto final de suas jornadas. Eu sinto em vocês uma força cujo potencial pulsa timidamente ainda, mas que já vibra buscando todo seu poder interior.
- O senhor vê isso tudo apenas olhando para a gente? – interrompeu Lehvinia, com certo ar de curiosidade.
- Sim, minha jovem maga. Eu vejo em vocês dois, pois a Força Arcana que pulsa em vocês é visível para mim através de suas auras. E suas estrelas começam a brilhar intensamente através de suas auras.
- Mas por que o senhor está nos dizendo isso agora? Existe algo que o senhor saiba de fato, e que nós não tenhamos conhecimento ainda? – questionou Vohldrik.
- Jovem Vohldrik, apenas relembrando o que eu havia lhe dito assim que você chegou aqui. Não tenho muito que lhes contar, e algumas coisas que sei não me é permitido contar, ainda. O que eu sei no momento e que posso realmente revelar é que vocês não estão aqui por acaso, e que vou designar vocês dois para uma missão importantíssima.
- Missão importantíssima? – Lehvinia perguntou com ar de puro espanto. – Até o momento, Capitão Mark, a missão mais importante a qual fui designada foi trazer o diário até o senhor. O que poderia ser mais importante ainda?
- E por que nós dois, Capitão? – as perguntas de Vohldrik eram mais questionadoras do que as de Lehvinia. – Por que, especificamente, o senhor decidiu por nós dois? O senhor mal nos conhece e não sabe realmente se teremos êxito na missão que deseja nos passar.
- Meu jovem, a missão surgiu depois que avaliei todas as informações que me foram trazidas hoje, tanto o diário entregue por Lehvinia quanto as notícias do soldado mensageiro. E a missão se configura de caráter urgente. E sendo urgente, não tenho realmente tempo de solicitar guerreiros ao Condado principal do Deserto da Lamentação. Por isso, decidi por entregar essa missão a vocês dois. Tenho certeza de que vocês farão o melhor para cumprir seus objetivos. Vocês já me deram prova suficiente do potencial de ambos. Confesso que não sou de receber muitas visitas aqui em meus domínios. Entretanto, estejam cientes de que também não são todos os guerreiros e jovens lutadores que conseguem chegar até aqui. A maioria mesmo sequer consegue encontrar minha morada, e muitos desistem antes da metade do caminho ser alcançado.
- O senhor está nos dizendo que a maioria dos guerreiros não encontra a estrada até aqui?
- Exatamente. O deserto é o maior dos obstáculos, além dos monstros que a habitam por toda a sua extensão. As planícies e os vales traiçoeiros acabam enganando os viajantes, deixando-os confusos, cansados, desanimados, e a maioria desiste ou se perde pelo deserto. Vocês foram corajosos e demonstraram o contrário. Mostraram determinação e empenho em chegar aqui. E isso os habilita plenamente para a missão.
O Capitão Mark virou-se e foi em direção às estantes imensas de livros e pergaminhos. Subiu em uma bancada móvel com rodinhas, e equilibrou-se nos primeiros degraus de uma escada. Parecia estar procurando algo em determinada parte da estante. Havia algumas caixas em meio aos livros e pergaminhos. Por fim, encontrou uma pequena caixa de veludo marrom escuro, e sacudiu um pouco a poeira que havia por cima dela. Desceu da bancada e retornou na direção de Vohldrik e Lehvinia. Pousou a caixa sobre uma mesa, entre livros e candelabros, e chamou os dois. Enquanto o Capitão Mark abria a caixa, ele explicava o conteúdo da mesma.
- Dado o caráter de urgência da missão, a jornada de vocês será para o Continente de Midreth.
- Para Midreth? – espantou-se Vohldrik
- Exatamente. Entretanto, o tempo está contra nós, e não posso realmente aguardar mais do que o necessário até que vocês finalmente cheguem no destino decidido.
- Mas, Capitão Mark, não entendo como poderemos ajudar com essa missão urgente sendo ela em Midreth – disse Lehvinia.
Foi neste momento que o Capitão mostrou para Vohldrik e Lehvinia dois cartões transparentes, do tamanho exato da palma da mão. À primeira vista, pareciam feito de vidro, mas eram extremamente finos e flexíveis, e olhando mais de perto, podia-se conferir todo o mapa de Nevareth gravado levemente como marca d’água. O Capitão entregou os cartões para os dois.
- O que estou entregando a vocês é algo que vai facilitar incrivelmente a viagem, que praticamente será um problema a menos para ambos. São cartões de teletransporte. Com eles, vocês poderão se deslocar com mais rapidez e alcançar regiões mais distantes. Uma vez usado, o cartão não poderá mais ser utilizado por outra pessoa a não ser a primeira pessoa que o utilizou, e também não pode ser transferido para outra pessoa.
- Isso quer dizer que se eu usar este cartão pela primeira vez, mais ninguém poderá utilizar ele a não ser eu mesmo? – perguntou Vohldrik.
- Isso mesmo. E os cartões só podem ser utilizados nos portais que ficam nos arredores das cidades dos principais condados dos diversos continentes.
- Mas eu nunca vi esses cartões antes, e nem ouvi falar desses tais portais. Qual o motivo desse mistério? – indagou Lehvinia, enquanto examinava cuidadosamente o cartão em suas mãos.
- Minha jovem maga, tanto os cartões quando os portais são apenas utilizados por guerreiros previamente selecionados para missões cuja natureza seja de relevante urgência ou de extremo segredo.
- A exemplo de nossa missão. – disse Vohldrik
- Exatamente! – exclamou o Capitão de maneira contida. – Por isso, não revele os cartões a ninguém, mantenha-os em segurança e utilizem as passagens nos portais com o máximo de cuidado, para que as pessoas não os vejam.
- Eu posso contar sobre isso ao meu irmão, Capitão?
- Não. Não revele o cartão para o seu irmão. E não se preocupe com isso no momento. Toda revelação poderá ser feita no seu devido tempo.
- Capitão Mark, e como saberemos para onde estaremos indo ao atravessar o portal?
- Realmente, como saberemos? – Vohldrik reforçou a pergunta de Lehvinia.
- Ao entrar no Portal, vocês estarão diante de diversos outros portais. Alguns deles estarão mostrando símbolos e brasões das principais cidades dos condados nos diversos continentes. Isso facilitará encontrar o destino de vocês.
- O senhor disse alguns deles. E quanto aos portais que não mostrarem símbolo algum?
- Não se preocupem. Esses portais necessitam de outros cartões de acesso. Sem eles, vocês não terão como atravessá-los.
O Capitão Mark fechou a pequena caixa de veludo, e tratou de colocá-la no mesmo lugar onde a havia encontrado. Enquanto descia mais uma vez a bancada móvel, Vohldrik olhou para sua face de maneira questionadora, pois sabia que a pergunta mais importante ainda não havia sido feita.
- Capitão, o senhor ainda não nos disse qual é realmente a nossa missão.
Houve um brevíssimo silêncio naquele momento, enquanto o Capitão olhava seriamente para o jovem guerreiro e a atenta maga, antes de revelar de maneira decidida e curta qual seria a missão dos dois.
- A missão de vocês é encontrar Kashu.